Vamos falar sobre a peça teatral "A Moratória" de Jorge de Andrade.
O texto teatral A Moratória, de Jorge Andrade, aborda a ruína de uma família proprietária de cafezais no interior do estado de São Paulo, em decorrência da crise financeira e da produção cafeeira, por volta dos anos de trânsito da década de 1920 para a 1930. Escrita em 1954, encenada pela primeira vez no ano seguinte, a peça emerge como um dos “fantasmas” da infância do autor. A obra constitui um ato de reflexão sobre a realidade paulista em seus aspectos sociais, morais e psicológicos. O tema da decadência dos latifúndios cafeeiro representa o fim de toda uma classe patriarcal e semifeudal de aristocratas sucumbidos à crise econômica de 1929 e a nova ordem social imposta por Vargas em 1930.
Ao mesmo tempo, focaliza em seu interior o conflito de gerações, o conflito de valores tradicionais em uma sociedade que vive a rápida mudança provocada pelo êxodo rural, pelo dilatamento das cidades e pelas mudanças das elites. Centralizando o conflito está o velho Quim, um coronel à antiga, que vê os filhos e a mulher minguarem, saudosos dos velhos tempos e sem perspectivas de futuro. Ambientada em dois momentos - os anos de 1929 e 1932, antes e depois do desastre econômico, a estrutura dramatúrgica intercala cenas na casa da fazenda e cenas na pequena casa da cidade, onde a família passa a viver dos modestos ganhos dos filhos, especialmente de Lucília, que se torna costureira.
Esse recurso permite ao autor apresentar o verso e o reverso das situações, justificando comportamentos e projetando expectativas. A alternância entre os dois momentos, mostrados simultaneamente, constitui-se no trunfo maior da arquitetura cênica de A Moratória.
Peça em três atos e ambientada em dois espaços; uma sala ampla de uma antiga casa grande de uma fazenda de café; e uma sala pequena numa casa modesta para onde a família já sem recursos passou a morar.
Segundo o grande crítico teatral brasileiro Sábato Magaldi, Jorge de Andrade ao adaptar sua peça em dois planos, um no ano de 1929, na crise do café, e outra em 1932 durante a grande crise mundial da queda da Bolsa de Nova York quis deixar bem marcada a queda irremediável da aristocracia rural. Há ironia e quase sadismo na repetição do jogo de esperança e desespero, até que o pano baixe sobre um silêncio mortal. Apenas 1929 seria o retrato da crise, da perda da fazenda com o aviltamento do preço do café. Mas um grupo não morre de uma vez, a não ser pela revolução, e “A moratória” compraz-se em consignar os estertores, a última tentativa de sobrevivência. Procura-se alegar, judicialmente, a nulidade do processo de praceamento, mas uma sutileza jurídica, arbitrária quase na indiferença com que atua, torna vão o esforço. 1932 encerra em definitivo uma fase da vida nacional e “A moratória” sela, na literatura, o processo de decomposição.
A primeira montagem da peça aconteceu no teatro Maria Della Costa em São Paulo com direção de Gianni Ratto, com Monah Delacy, Fernanda Montenegro, Wanda Cosmos e Elísio de Albuquerque, em 1955.
Ao final da peça, com a moratória recusada pelo governo, apesar dos esforços de Olímpio, advogado e noivo de Lucília, que entrou com um último recurso na tentativa de recuperar a fazenda da família da noiva, todos acabam tendo que se conformar com a nova realidade. Lucília então toma para si a responsabilidade de recuperar a dignidade da família.
Com A Moratória, Jorge Andrade inovou a escrita teatral brasileira ao valorizar e se preocupar também com a encenação. A ação da peça acontece em “dois planos que dividem o palco mais ou menos em diagonal”, escreve ele no começo do primeiro ato. O primeiro plano, ou plano da direita, representa a sala da casa da cidade onde eles residem no presente, enquanto o segundo plano, ou plano da esquerda, representa a sala da fazenda em 1929, pouco antes de ir a leilão.
Embora estejam separados pelo tempo e pelo espaço, os planos dialogam entre si. O que acontece num plano reverbera no outro. A princípio, tal recurso poderia causar confusão, mas Jorge Andrade, com sua carpintaria dramática requintada, acentua o drama dessa família através dos contrastes e das semelhanças, e também da complementação das situações e diálogos em curso num e noutro plano. Isto vem para mostrar como a roda da fortuna, ao girar, traz para baixo quem estava por cima, neste caso, os coronéis latifundiários que enriqueceram com o chamado “ouro verde”.
A Moratória é um ótimo exemplo de um drama nacional com um tema nacional, no qual Jorge Andrade retrata, com maestria e lucidez, um importante período de transição na história econômica do Brasil. Essa peça ajudou a consolidar a produção de uma dramaturgia tipicamente brasileira, um teatro que, literalmente, fala a nossa língua, que fala da nossa história, da nossa gente. Leitura indispensável para os amantes da pátria amada.
A moratória - grupo Tapa
Fontes:
passeiweb.com
youtube.com
google.com
faciletrando.wordpress.com
memorialdademocracia.com.br
assistoporquegosto.com.br
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