O Evangelho segundo Jesus Cristo.
O livro do escritor português José Saramago, publicado em 1991, logo no lançamento atraiu críticas ferozes da Igreja Católica, coisa já amplamente esperada uma vez que a Igreja quer para si o monopólio de contar a História de Jesus de Nazaré.
Quando saiu a público, em novembro de 1991, o Evangelho segundo Jesus Cristo suscitou reações polémicas de parte dos Católicos. Entre elas, a do Arcebispo de Braga Primaz das Espanhas, D.Eurico Dias Nogueira, proferida em Maio de 1992: "Um escritor português, ateu confesso e comunista impenitente, como ele mesmo se apresenta, resolveu elaborar uma delirante vida de Cristo, na perspectiva da sua ideologia político-religiosa e distorcida por aqueles parâmetros." D. Eurico continua: "A apregoada beleza literária, a existir nesta obra, longe de atenuante e muito menos dirimente, constitui circunstância agravante da culpabilidade do réu, seu autor."
Vital Capelo, no jornal O Arrais de Peso da Régua, afirma acerca de Saramago e do romance: "Sendo o autor um descrente, não deveria ter a ousadia de imiscuir-se em assuntos de natureza religiosa (...) sob pena de ser aplicado o velho «Quem te mandou, sapateiro, tocar rabecão?!»." E enfatiza: "a juventude de Jesus é puramente fantasista e fruto da imaginação do autor (...)", completando que "na parte respeitante ao adulto, Jesus é completamente deformado, já que se faz dele um milagreiro andante, cuja História é bem conhecida, sendo apresentado como um vulgar aventureiro, despido de todo o esplendor de que foi cercado."
"Quem não conheceu a si mesmo não conhece nada, mas quem se conheceu veio a conhecer simultaneamente a profundidade de todas as coisas."
Esta frase acima é atribuída a Jesus Cristo. Mas não adianta ir procurá-la na Bíblia. Ela não está em nenhum lugar dos Evangelhos de Lucas, Marcos, Mateus ou João, os únicos relatos da vida de Jesus que a Igreja considera autênticos. A citação faz parte de um outro evangelho – o de Tomé. Também não perca seu tempo procurando por esse livro no Novo Testamento. Não há por lá nenhum evangelho com o nome do mais cético dos apóstolos, aquele que queria “ver para crer...
Acontece que o texto existe. E é um documento antigo – segundo alguns pesquisadores, tão antigo quanto os que estão na Bíblia . O Evangelho de Tomé, assim como outras dezenas – ou centenas – de textos semelhantes, foi escrito por alguns dos primeiros cristãos, entre os séculos 1 e 3 da nossa era. Ele foi cultuado por muito tempo. Até que, em 325, sob o comando do imperador romano Constantino, a Igreja se reuniu na cidade de Nicéia, na atual Turquia, e definiu que, entre os inúmeros relatos sobre a vinda de Cristo que existiam, só quatro eram “inspirados” pelo filho de Deus.
– os “evangelhos canônicos” (“evangelho” vem da palavra grega que significa “boa nova”, usada para designar a notícia da chegada de Cristo, e “canônico” é aquele que entrou para o cânone, a lista dos testos escolhidos. Os outros eram “apócrifos” (de legitimidade duvidosa). Estes foram proibidos, seus seguidores passaram a ser considerados hereges e muitos foram excomungados, perseguidos, presos. A maioria dos apócrifos foram destruídos, alguns para sempre, até que em 1945, foram achados uns antigos pergaminhos por dois irmãos numa caverna, perto da cidade egípcia de Nag Hammadi. Só nos últimos anos os textos acabaram de ser traduzidos e chegaram ao conhecimento dos cristãos do mundo.
O livro conta uma história ficcionada e humanizada da vida de Jesus e alude a uma sua eventual relação com Maria Madalena (no livro, foi com ela que Jesus "conheceu o amor da carne e nele se reconheceu homem"). O primeiro capítulo narra a crucificação, fala de José de Arimatéa, de Maria, mãe de Jesus e Maria Madalena.
"E a companheira do [Salvador era Maria Madalena. [Cristo amou] Maria] mais do que [todos] os discípulos, e costumava] beijá-la [frequentemente] na [boca]. Os demais [discípulos se ofendiam com isso e expressaram seu descontentamento]. Eles disseram "Por que você a ama mais do que a nós?" O Salvador respondeu-lhes, "Por que eu não vos amo como a amo?" ”
— Atribuído a Filipe, Evangelho de Filipe
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Segundo as escrituras bíblicas nenhum apóstolo foi visto no local da crucificação.
Ao adotar essa perspectiva, de humanização de Cristo, distante da representação tradicional do Evangelho, Saramago coloca que a propaganda histórica da crucificação de Jesus, "um revulsivo forte, qualquer coisa capaz de chocar as sensibilidades e arrebatar os sentimentos", resultou na imposição de "uma história interminável de ferro e de sangue, de fogo e de cinzas, um mar infinito de sofrimento e de lágrimas", de acordo com a sua visão de mundo, segundo a qual “por causa e em nome de Deus é que se tem permitido e justificado tudo, principalmente o mais horrendo e cruel", e que, "no fundo, o problema não é um Deus que não existe, mas a religião que o proclama. Denuncio as religiões, todas as religiões, por nocivas à Humanidade. São palavras duras, mas há que dizê-las". Isso levou a que o livro fosse considerado ofensivo por diversos setores da comunidade católica, a que ele sofresse perseguição religiosa no seu próprio país, e a que o governo português, pressionado pela Igreja Católica e por meio do então Subsecretário de Estado da Cultura de Portugal, António de Souza Lara, vetasse este livro duma lista de romances portugueses candidatos ao Prêmio Aristeion em 1992 por "atentar contra a moral cristã".
Voltando à obra, Saramago fala do nascimento de Jesus, de sua infância, adolescência e vida adulta.
"Viviam José e Maria num lugarejo chamado Nazaré, terra de pouco e de poucos, na região de Galileia, em uma casa igual a quase todas, como um cubo torto feito de tijolos e barro, pobre entre pobres. Invenções de arte arquitetônica, nenhumas, apenas a banalidade uniforme de um modelo incansavelmente repetido. Com o propósito de poupar alguma coisa nos materiais, tinham-na construído na encosta da colina, apoiada ao declive, escavado pelo lado de dentro, deste modo se criando uma parede completa, a fundeira, com a vantagem adicional de ficar facilitado o acesso à açoteia que formava o teto. Já sabemos ser José carpinteiro de ofício, regularmente hábil no mester, porém sem talento para perfeições sempre que lhe encomendem obra de mais finura. Estas insuficiências não deveriam escandalizar os impacientes, pois o tempo e a experiência, cada um com seu vagar, ainda não são bastantes para acrescentar, ao ponto de dar-se por isso no trabalho de todos os dias, o saber oficinal e a sensibilidade estética de um homem que mal passou dos vinte anos e vive em terra de tão escassos recursos e ainda menores necessidades."
O texto extraído do Livro está em português falado em Portugal.
Um mendigo aparece para José e Maria que estão a jantar. Maria pega uma porção de comida e coloca numa tigela e dá para o mendigo. Ao terminar de comer ele devolve a tigela e diz:
Turbou-se Maria e perguntou, Isso que quer dizer,
e o mendigo respondeu apenas, Mulher, tens um filho
na barriga, e esse é o único destino dos homens, começar
e acabar, acabar e começar, Como soubeste que estou
grávida, Ainda a barriga não cresceu e já os filhos
brilham nos olhos das mães, Se assim é, deveria meu
marido ter visto nos meus olhos o filho que em mim gerou,
Acaso não olha ele para ti quando o olhas tu, E tu
quem és, para não teres precisado de ouvi-lo da minha
boca, Sou um anjo, mas não o digas a ninguém.
Naquele mesmo instante, as roupas resplandecentes
voltaram a ser farrapos, o que era figura de titânico
gigante
encolheu-se e mirrou como se o tivesse lambido
uma súbita língua de fogo, e a prodigiosa transformação
foi mesmo a tempo, graças a Deus, e logo a seguir a
prudente retirada, que do portal já vinha acercando-se
José, atraído pelo rumor das vozes, mais abafadas do
que o natural duma conversação lícita, mas sobretudo
pela exagerada demora da mulher, Que mais te queria o
pobre, perguntou, e Maria, sem saber que palavras suas
poderia dizer, só soube responder, Do barro ao barro,
do pó ao pó, da terra à terra, nada começa que não acabe,
nada acaba que não comece, Foi isso que ele disse,
Sim, e também disse que os filhos dos homens brilham
nos olhos das mulheres, Olha para mim, Estou a olhar,
Parece-me ver um brilho nos teus olhos, foram palavras
de José, e Maria respondeu, Será o teu filho.
Notem que as críticas da Igreja, tal qual, na Idade Média, são contra a uma interpretação diferente do chamado "código Canônico"; o seja quaisquer interpretações que discordem dos ensinamentos da Igreja devem ser combatidos com tenacidade.
José Saramago é único escritor de Língua Portuguesa a ganhar um Prêmio Nobel de Literatura até hoje. Ganhou o prêmio em 1998, o que mostra o caráter politico e seletivo dos "julgadores" do Prêmio Nobel, principalmente dos Prêmios de Literatura e da Paz. Autores como Fernando Pessoa, Jorge Amado, Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Mia Couto, foram grandes ícones da Literatura em Língua Portuguesa e nunca foram premiados. O grande problemas é que a Língua portuguesa embora seja o quinto idioma mais falado no mundo é relegado a um segundo plano na Literatura Mundial.
Fontes:
wikipedia.org
super.abril.com.br
google.com
revistaforum.com.br
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