quarta-feira, 27 de maio de 2020

Figuras de construção


As figuras de construção, ou de sintaxe, ocorrem quando desejamos fazer alterações intencionais das estruturas sintáticas dos enunciados com o objetivo de atribuir maior expressividade ao seu significado. Quando esses recursos são utilizados, ocorrem inversões, omissões e repetições que levam a uma maior ênfase. Assim, de modo geral, o sentido lógico do enunciado é substituído por outro mais expressivo. Vejamos quais são elas:

→ Elipse

Consiste na omissão de um ou mais termos em uma oração, os quais podem ser facilmente identificados tanto por elementos gramaticais presentes na própria oração quanto pelo contexto. Sempre que for possível identificar o termo omitido a partir do contexto criado pelo texto, teremos uma elipse.

Observe os exemplos:

A cada um, o que lhe é de direito. (Deve ser dado a cada um o que é seu.)

Tenho dois filhos, um neto e amo todos da mesma maneira. (Observe que o sujeito/pronome "eu" está elíptico no verbo da oração. É relevante ressaltar que a elipse resolve a redundância de pronomes em: 'Eu tenho [eu]', 'Eu amo [eu]', 'Eu irei fazer' [Farei].

André Luiz estava atrasado. Optou pelo elevador. (André Luiz optou por utilizar o elevador, pois estava atrasado.)

As focas acasalam em maio; as baleias, em agosto. (As baleias acasalam em agosto.)

→ Zeugma

Zeugma é uma forma particular de elipse. Ele ocorre quando o termo omitido já havia sido mencionado anteriormente.

Observe os exemplos:

Mariana gosta de sorvete; eu, de chocolate meio amargo.
(sorvete)

                                             

No escritório de Joana, só há equipamentos antigos; no meu, só modernos.
(equipamentos)

No céu, há estrelas; na Terra, brigadeiro.
                                                    (céu)


→ Silepse

A silepse é a concordância atribuída ao termo que não está expresso no texto, mas, sim, à ideia que o termo representa. Podemos inferir que se trata de uma concordância psicológica, anormal, porque se faz com um termo oculto, mas facilmente subentendido. Há três tipos de silepse: de gênero, número e pessoa.


Silepse de gênero

Como sabemos, na Língua Portuguesa, temos os gêneros masculino e feminino. A silepse de gênero ocorre quando a concordância é realizada conforme a ideia que o termo comporta.

Observe os exemplos:

A bela Rio Branco sofreu com o frio intenso.

Note que o adjetivo 'bela' não está concordando com o substantivo próprio comum 'Rio Branco', o qual, gramaticalmente, pertence ao gênero masculino. Assim, o adjetivo concorda com a ideia contida no interior do termo, ou seja, a cidade de Rio Branco.

Vossa Excelência está muito abalado.

Nesse caso, note que o adjetivo 'abalado' concorda com o gênero masculino, e não com o termo 'Vossa excelência', que é do gênero feminino.


Silepse de número

Ocorre quando o verbo não concorda sintaticamente com o sujeito da oração, mas, sim, com a ideia contida nele.

Observe os exemplos:

O pelotão saiu. Caminharam em sentido ao batalhão.

Como está indo a classe? Estão bem?


Silepse de pessoa

Sabemos que existem três pessoas gramaticais: a primeira (eu/nós), a segunda (tu/vós) e a terceira (ele/eles). A Silepse de pessoa acontece quando há um desvio de concordância entre pessoas em uma mesma frase. Assim sendo, o verbo não concorda com o sujeito da oração, mas com a pessoa que está incluída no sujeito.

Observe o exemplo:

Bom é que os quatro queremos casar na mesma data.

→ Polissíndeto

Trata-se da coordenação de vários termos da oração, sobretudo por meio das conjunções aditivas 'e', 'nem', 'mas'.

Observe os exemplos:

Sabe que é difícil ser aprovado, mas tenta, mas estuda, mas vá em frente.

Mariana, aos doze anos, cantava e gritava e dançava e pulava e era aquela festa!

A repetição das conjunções 'mas' e 'e' chama a atenção do leitor para o trabalho com a linguagem para enfatizar os verbos do período composto.

→ Assíndeto

Ao contrário do polissíndeto, o assíndeto é em uma figura de construção/sintaxe caracterizada pela ausência das conjunções coordenadas.

Observe o exemplo:

Tens moradia, tens alimento, tens roupa lavada, tens roupa passada, tens amor.

→ Pleonasmo

Consiste na repetição de um termo ou ideias por meio das mesmas palavras ou palavras diferentes. O objetivo do pleonasmo é realçar a ideia a fim de torná-la mais expressiva.

Vi, adoravelmente visto, o rostinho do bebê.

Viva a sua vida.

É preciso salientar que, quando não utilizados de maneira consciente e/ou intencional, alguns pleonasmos são considerados como vícios de linguagem, ou seja, quando a repetição informa uma obviedade e não desempenha funções expressivas no enunciado. Veja alguns exemplos:

Subir para cima;

Descer para baixo;

Entrar para dentro;

Sair para fora.

→ Anáfora

É a repetição de uma ou mais palavras no início de versos e/ou frases que cria um efeito de reforço e de coerência ao texto. Os termos anafóricos podem, muitas vezes, ser substituídos por pronomes relativos.

Observe como exemplo o trecho do texto de Eduardo Galeano:

Insólito foi o campeão e o vice da Copa anterior terem voltado para casa sem abrir as malas. Em 2006, Itália e França fizeram a final. Agora, encontraram-se na saída do aeroporto.

[…]

Insólito foi que faltaram ao encontro os superastros mais aguardados. Messi quis comparecer, fez o que pôde, e viu-se alguma coisa. Dizem que Cristiano Ronaldo esteve lá, mas ninguém o viu: talvez tenha estado ocupado demais vendo a si mesmo.

Insólito foi uma nova estrela, inesperada, ter surgido da profundeza dos mares e se elevado ao ponto mais alto do firmamento futebolístico.

[…]

Insólito foi que no fim houve justiça, o que não é frequente no futebol e na vida. A Espanha venceu a Copa pela primeira vez. Quase um século esperando. O polvo anunciou, e a Espanha desmentiu minhas suspeitas.


"Onde está Z agora ? Ele não se importa com o formigueiro: Por isso raptou a princesa, por isso, fugiu, por isso se passou por soldado..... (Filme FormigunhaZ)

→ Anacoluto

Anacoluto é a interrupção de uma oração iniciada por uma palavra ou locução, que sofre uma mudança da construção sintática, ou seja, em sua estrutura, resultando no desligamento entre o início e o restante do(s) período(s). Essa estrutura que não se integra à parte interrompida é chamada de anacoluto.

Essa figura de sintaxe é mais comum na fala do que na escrita. Isso ocorre porque grande parte dos falantes recorre à topicalização, destacando anteriormente o que será o assunto da conversa e, em seguida, tecem comentários a seu respeito. O anacoluto também é chamado de "frase quebrada", pois corresponde a uma interrupção na sequência lógica do pensamento. Também podemos encontrar o anacoluto em muitos provérbios típicos da linguagem verbal oral, por exemplo: 'Quem ama o feio, bonito lhe parece'.

O anacoluto deve ser usado com finalidade expressiva em casos muito especiais. Em geral, a menos que seja uma (des)construção sintática intencional, devemos evitá-lo e criar melhores condições para que nossos interlocutores nos compreendam no momento da interação verbal.

Observe os exemplos:

Meu vizinho, soube que ele está no hospital.

A princípio o substantivo vizinho parece ser o sujeito da frase, depois, no entanto que o pronome "ele" é que é o sujeito e o substantivo "vizinho" ficou solto na frase.

Outro exemplo:
Portugal, quantas lembranças tenho!


O marizeiro que ficava embaixo, a correnteza corria por cima dele. (José Lins do Rego, 1976.)

Na oração inicial, o marizeiro foi definido como tópico e, em seguida, na segunda oração, o período muda de direção, dando a impressão de que algo ficou solto em sua estrutura. Assim, as estruturas sintáticas reorganizam-se em função de outro sujeito: a correnteza.

Dos funcionários da lavanderia, não se pode duvidar.

A expressão 'os funcionários' deveria exercer a função de sujeito.  No entanto, há uma interrupção da frase e essa expressão fica à parte, não exercendo nenhuma função sintática.

→ Hipérbato

Sabemos que, na Língua Portuguesa, a ordem da maioria das orações é a seguinte:

Sujeito + Verbo + Complemento(s) + Adjunto(s) adverbial(is)

Silvana comprou um carro ontem.

Assim, quando invertemos essa ordem (Um carro Silvana comprou ontem.), criamos a figura de construção ou de sintaxe conhecida como hipérbato.

Observe os exemplos:

É como brisa o amor. (Na ordem direta seria: O amor é como brisa.)

Dos meus assuntos cuido eu! (Na ordem direta seria: Eu cuido dos meus assuntos.)

→ Sínquise

Alguns hipérbatos provocam inversões tão acentuadas na estrutura sintática dos períodos que provocam ambiguidades e comprometem a compreensão do que está sendo falado ou escrito. Quando isso ocorre, temos o que chamamos de sínquise. Raymond Queneau escreveu um texto integralmente constituído de sínquises. Leia um exemplo:

“Vago senta sobre e se se um lugar dito precipita, isto.”
Ou na poesia de Camões: "Descalça vai pera fonte..."



Fontes:
portugues.com.br
todamateria.com.br

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