Vamos falar da obra de Joaquim Nabuco - Minha Formação.
Capítulo I
Colégio e academia
"Não preciso remontar ao colégio, ainda que ali, provavelmente, tenha sido lançada no subsolo da minha razão a camada que lhe serviu de alicerce: o fundo hereditário do meu liberalismo. Meu pai nessa época (1864-1865) tinha terminado a sua passagem do campo conservador para o liberal, marcha inconscientemente começada desde a Conciliação (1853-1857), consciente, pensada desde o discurso que ficou chamado do uti possidetis (1862). Houve diversas migrações em nossa história política do lado liberal para o conservador. Os homens da regência, que entraram na vida pública ou subiram ao poder representando a ideia de revolução, foram com a madureza dos anos restringindo as suas aspirações, aproveitando a experiência, estreitando-se no círculo de pequenas ambições e no desejo de simples aperfeiçoamento relativo, que constitui o espírito conservador. O senador Nabuco, porém, foi quem iniciou, guiou, arrastou um grande movimento em sentido contrário, do campo conservador para o liberal, da velha experiência para a nova experimentação, das regras hieráticas de governo para as aspirações ainda informes da democracia."
Minha Formação foi um livro de memórias escrito pelo político, diplomata e escritor membro da Academia Brasileira de Letras - Joaquim Nabuco, um dos grandes nomes do movimento abolicionista, publicado em 1900. Neste livro, o autor aborda livremente fatos de sua vida intelectual, política e diplomática. Ele narra sua experiência no exterior e as influências marcantes de países como a Inglaterra, os EUA e a França, nos quais viveu por tempo considerável. Relata também o seu contato com grandes personalidades, como o filósofo Ernest Renan, a escritora George Sand e o papa Leão XIII. O livro conta com grandes digressões sobre o percurso do pensamento político do autor, sua inicial tentativa literária (posteriormente abandonada) e, principalmente, sobre a sua ativa e marcante participação no movimento abolicionista.
Capítulo V
Primeira viagem à Europa
"De diversos modos a minha primeira ida à Europa influiu para enfraquecer as tendências republicanas que
eu porventura tivesse, e fortificar as monárquicas. Antes de tudo, o republicanismo francês, que era e é o nosso, tem
um fermento de ódio, uma predisposição igualitária que logicamente leve à demagogia – a sua maior figura é
Danton, o homem da Setembrizada –, ao passo que o liberalismo, mesmo radical, não é só compatível com a
monarquia, mas até parece aliar-se com o temperamento aristocrático. Se fosse preciso personificar o liberalismo,
poder-se-ia chamar-lhe Lafayettismo, por ter sido Lafayette o principal representante dos gentilhommes libéraux de
1789. Esse estreito republicanismo, que confina nos dias de crise com a demagogia, e, exasperado pelo perigo ou
excitado pela posse repentina, imprevista, do poder, chega à epidemia sanguinária do Terror, é um fato, pode-se
dizer, de reclusão mental: dá-se somente quando o espírito se encerra em algum sistema filosófico ou fanatismo
religioso, em uma doutrina ou em uma previsão social qualquer, e aí se isola inteiramente do mundo externo. A
intolerância é, ou era, o característico do republicanismo agressivo francês, e a intolerância é uma fobia da liberdade
e do mundo; é um fenômeno de retração intelectual, produzindo a hipertrofia ingênua da personalidade."
"Nós, brasileiros - o mesmo pode-se dizer dos outros povos americanos - pertencemos à América pelo sedimento novo, flutuante, do nosso espírito, e à Europa, por suas camadas estratificadas. Desde que temos a menor cultura, começa o predomínio destas sobre aquele. A nossa imaginação não pode deixar de ser europeia, isto é, de ser humana; ela não para na Primeira Missa no Brasil [...]. A instabilidade a que me refiro provém de que na América falta à paisagem, à vida, ao horizonte, à arquitetura, a tudo o que nos cerca, o fundo histórico, a perspectiva humana; que na Europa nos falta a pátria, isto é, a forma em que cada um foi vazado ao nascer. De um lado do mar sente-se a ausência do mundo; do outro, a ausência do país. O sentimento em nós é brasileiro, a imaginação europeia. As paisagens todas do Novo Mundo, a floresta amazônica ou os pampas argentinos, não valem para mim um trecho da Via Appia, uma volta da estrada de Salerno a Amalfi, um pedaço do cais do Sena à sombra do velho Louvre"
Esta passagem do terceiro capítulo de Minha Formação deu origem a expressão Mal de Nabuco ou Moléstia de Nabuco, se referindo a um sentimento de brasileiros de pertencimento à cultura europeia, imaginada como universal e mais valorosa que a brasileira.
Hoje, podemos dizer que esse sentimento transferiu-se para a cultura norte-americana. Continuamos, pois, com nosso complexo de inferioridade.
Fontes:
wikipedia.org
google.com
dominiopublico.gov.br
jornalopcao.com.br
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