Vamos falar do romance Casa Velha de Machado de Assis.
CAPÍTULO PRIMEIRO ANTES
E DEPOIS DA MISSA
"Aqui está o que contava, há muitos anos, um velho cônego da Capela Imperial: — Não desejo ao meu maior inimigo o que me aconteceu no mês de abril de 1839. Tinha-me dado na cabeça escrever uma obra política, a história do reinado de D. Pedro I. Até então esperdiçara algum talento em décimas e sonetos, muitos artigos de periódicos, e alguns sermões, que cedia a outros, depois que reconheci que não tinha os dons indispensáveis ao púlpito. No mês de agosto de 1838 li as Memórias que outro padre, Luís Gonçalves dos Santos, o padre Perereca chamado, escreveu do tempo do rei, e foi esse livro que me meteu em brios. Achei-o seguramente medíocre, e quis mostrar que um membro da igreja brasileira podia fazer coisa melhor."
Essa obra foi publicada na revista Estação entre janeiro de 1885 e fevereiro de 1886, e só foi publicada na forma de um livro em 1944 pela crítica e biografa de Machado de Assis, Lucia Miguel-Pereira.
O livro remete à fase romântica da obra machadiana, e conta a historia de um padre que pretende escrever uma obra sobre a formação do Primeiro Reinado no Brasil e, para isso, investiga a casa de um ex-ministro buscando documentos que seriam úteis para a sua pesquisa. No romance, não é revelado o tempo em que a história se passa.
Foi nessas circunstâncias que deu início à sua freqüência na chamada Casa Velha, após o padre Mascarenhas, pregador da capelinha da casa, insistir muito. Ali vivera um ministro que trabalhara para o Imperador. Agora na casa viviam apenas seu filho, Félix, sua viúva, D. Antônia e os empregados.
"A casa, cujo lugar e direção não é preciso dizer, tinha entre o povo o nome de Casa Velha, e era-o realmente: datava dos fins do outro século. Era uma edificação sólida e vasta, gosto severo, nua de adornos. Eu, desde criança, conhecia-lhe a parte exterior, a grande varanda da frente, os dois portões enormes, um especial às pessoas da família e às visitas, e outro destinado ao serviço, às cargas que iam e vinham, às seges, ao gado que saía a pastar. Além dessas duas entradas, havia, do lado oposto, onde ficava a capela, um caminho que dava acesso às pessoas da vizinhança, que ali iam ouvir missa aos domingos, ou rezar a ladainha aos sábados."
Ele, com a permissão da viúva, logo deu início ao estudo dos papéis e livros que estavam na biblioteca do ex-ministro. Em pouco tempo já se tornara amigo da família. Félix mostrava nutrir uma grande amizade pelo padre e vice-versa. Ele geralmente só voltava à sua casa ao anoitecer e passava ali o dia tomando notas na biblioteca, tendo conversas com Félix e almoçando com a família.
Sendo amigo da família, D. Antônia veio pedir-lhe que convencesse Félix de ir a Europa, e que o padre acompanhasse o rapaz. Enquanto isso, o rapaz confiava ao padre a vontade de ser deputado. O padre dava apoio à idéia dele e quando o inquiriu sobre a Europa ouviu de Félix que não podia ir.
Nesses dias chegou à Casa Velha uma mocinha com cerca de dezessete anos, chamavam-na de Lalau, tinha lindos olhos e aparentava ter uma linda alma também. Ela era agregada na casa, ficou órfã muito cedo e fora criada pela tia. Estando o padre na biblioteca, certa vez recebeu a visita de Lalau, ocasião em que ficaram um bom tempo conversando e ela lhe falou como trocaria tudo para ter a companhia de sua mãe de volta.
Ele já estava encantado pela menina, chegou a ver nela certo interesse por Félix, mas notou que parecia que ela o estimava mais. Depois observando o rapaz acreditou que ele, na verdade, fazia uma linha de sedutor. Entretanto, essa idéia se mostrou errada. Estando em sua casa, recebeu a visita de Félix e conversando com ele falou que Lalau devia se casar, ele citou que a mãe já pensara em um noivo para a menina, Silvirino – filho do segeiro. O padre então disse que ele não era um bom noivo para ela, visto que ela tinha recebido da melhor educação por parte de D. Antônia, e que o noivo ideal para ela era o próprio Félix.
Depois dessa conversa ele soube que os dois se amavam e ficou encarregado de interceder a favor do casamento dos dois com D. Antônia que era uma mulher orgulhosa e queria fazer do casamento do filho uma aliança entre famílias. Ele conversou muito com ela, mas o casamento não fazia a sua vontade e chegou até a confessar que Lalau era o motivo pelo qual queria que o filho fosse a Europa.
Alguns dias depois chegaram à Casa Velha alguns hóspedes para assistir as missas e participar da festa da Glória. Nesse episódio, ele pôde ver o interesse que D. Antônia tinha em ligar o filho a Sinhazinha, filha de um coronel que lhe ajudara com os relatos sobre o Imperador.
No dia seguinte à partida de todos, inclusive Lalau, que tinha voltado para a casa da tia, o padre chegou à casa de D. Antônia e notou sua preocupação. Questionada, ela deixou claro que acreditava que o casamento de seu filho e Lalau era impossível porque ela era filha do ministro, que teve seus romances fora do casamento. Ficou na responsabilidade dele contar que aos dois que eram irmãos.
Primeiro falou a Félix. Este ficou demasiadamente triste e passou a noite fora de casa, caminhando e refletindo. No outro dia confidenciou ao padre que agora o amor que tinha por Lalau se convertera em amor de irmão. Já Lalau, quando voltou à Casa Velha e encontrou os ares diferentes e a frieza de Félix, se entristeceu profundamente. Acreditava ter sido motivo de escárnio para Félix e afirmava não merecer nada diferente já que era pobre. Até que finalmente lhe contou o que se passava e a moça, tomada de tristeza, voltou para a casa da tia.
Lalau agora desejava apenas viver do trabalho que pudesse fazer para se sustentar e nunca iria se casar. Na Casa Velha, D. Antônia trabalhava para casar o filho com Sinhazinha e assim curá-lo totalmente da antiga paixão e também poder retomar a presença de Lalau em sua casa. A este ponto o padre já havia terminado seus estudos na biblioteca do ex-ministro.
Era seu último dia ali quando encontrou um bilhete que o fez procurar a tia de Lalau, Mafalda. Ele finalmente contou a ela o motivo do rompimento de Lalau com os moradores da Casa Velha. Sabendo da verdade, ela pode esclarecer os fatos. Era verdade que o ministro teve um caso com sua cunhada, mas nesse tempo Lalau já era nascida. O anjinho a que o ministro fazia menção no bilhete encontrado era o bebê, fruto de sua infidelidade, que morrera aos quatro meses de idade.
Alegremente, o padre foi procurar D. Antônia e contou-lhe toda a verdade. E ela também lhe contou toda a verdade. Ela criara a história sobre Félix e Lalau serem irmãos como último pretexto para impedir o casamento, e agora sabia que supusera corretamente, mas estava arrependida e aceitava o casamento do filho.
Félix se alegrou intensamente com a notícia, mas Lalau não. Esta não aceitou o casamento e disse que seria uma vergonha casar-se com o filho do homem que envergonhara sua família. Assim ela fez sua recusa e não cedeu às insistências do padre, da tia e até mesmo de Félix. Ao final ela se casou com Silvirino e Félix com Sinhazinha. Foram honestos, felizes não se sabe.
Fontes:
infoescola.com
vestibullar.brasilescola.uol.com.br
repositorio.ufmg.br
Assis, Machado - A casa velha.
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