55 anos exatos antes da Lei Áurea, em 13 de maio de 1833, aconteceu uma grande revolta no Estado de Minas Gerais, especificamente na fazenda dos Junqueira, grandes latifundiários e donos de escravos locais.
As fazendas de Campo Alegre e de Bela Cruz, onde a Revolta de Carrancas aconteceu, foram porções de terras doadas pela Coroa a João Francisco Junqueira. A família Junqueira possuía a maior parte dos escravos na região, que trabalhavam em suas terras. Cabe destacar que até 1850, quando a Lei de Terras transformou a terra em capital, media-se a riqueza pela quantidade de escravos que alguém possuía, e a família Junqueira tinha muitos à época. O medo era constante, principalmente após 1831, quando a população escrava da região tentou se organizar contra os seus senhores. Mas, a revolta escrava só veio a ocorrer dois anos depois, em 1833.
A revolta iniciou pela fazenda de Campo Alegre, posse de Gabriel Junqueira, proprietário de escravos e deputado da corrente liberal. Os escravos, sob a liderança de Ventura Mina, organizaram um motim e mataram Gabriel. De lá dirigiram-se para a Fazenda Bela Cruz, onde assassinaram a família de José Francisco Junqueira, irmão de Gabriel. Eles eram herdeiros de João Francisco. A saga continuou com o objetivo de matar outro membro da família: Manuel José da Costa, genro de José. Assim que chegou à Bela Cruz foi também morto. De lá o grupo de revoltosos partiu para a Fazenda Bom Jardim, propriedade de João Cândido Junqueira, que já avisado do ocorrido nas fazendas de Campo Alegre e Bela Cruz organizou a resistência, e assim os revoltosos encontraram lá maior dificuldade. Esse conflitou levou alguns revoltosos à morte, como foi o caso do líder Ventura Mina.
A movimentação dos escravos de Minas Gerais mostra a revolta com os senhores de escravos e com o trabalho compulsório. Homens e mulheres que foram escravizados lutaram pelo fim da exploração da sua força de trabalho e de suas vidas. A Revolta de Carracas é mais um exemplo de como a problemática da escravidão se mostrava cada vez mais complexa no Brasil do século XIX. Movimentos como este mostraram que o medo do haitianismo (revolta dos escravos contra os senhores de 1791-1804) não era infundado: se boa parte da população era escravizada, caso se organizassem conseguiriam tomar o poder e virar o jogo contra os senhores das terras, proprietários de escravos. Assim, a escravidão era um problema urgente, que exigia atenção. Pouco tempo depois estourou na Bahia o levante do Malês, que causou mais preocupação ainda aos proprietários e ao governo. Mas, a escravidão ainda demorou a acabar no Brasil.
A Freguesia de Carrancas possuía uma enorme população escravizada de origem africana. Em algumas regiões, como a capela do Favacho, o percentual de africanos equivalia a mais de 60% da população escrava. Esse número se explica por ser uma área voltada para o abastecimento e que possuía propriedades próximas aos caminhos que ligavam Minas Gerais ao Rio de Janeiro, imensamente dependente do tráfico internacional de escravizados.
A região de Carrancas se destacou por ter uma grande concentração de trabalho escravo. Dos 4 053 habitantes da freguesia, 62,5% (2 494) da população eram pessoas escravizadas e 38,5% (1 559) eram pessoas livres. Além disso, a região contava com várias propriedades ligadas ao abastecimento interno de gêneros alimentício.
As Fazendas de Campo Alegre e Bela Cruz, palcos da revolta, faziam parte de uma grande área de terra, oferecida pela Coroa a João Francisco, português de São Simão da Junqueira. Ele chegou em Rio das Mortes em 1750 e deixou um grande número de descendentes, dando início a uma grande família do sudeste mineiro possuidora de grandes propriedades.
A influência das propriedades da família Junqueira podia ser percebida pelo número de pessoas escravizadas que mantinham. Quase sempre, o número era maior que trinta escravos, o que era raro no cenário da época. E em algumas propriedades o número podia chegar a cem escravos.
Em julho de 1831, os escravizados de Carrancas ensaiaram uma tentativa de revolta contra seus senhores, movidos pelos rumores de que o ex-imperador os queria livres. O vigário da freguesia, Joaquim José Lobo, foi acusado de persuadir os escravizados com tais promessas. Os boatos de uma possível rebelião se espalharam rapidamente e a população ficou assustada, fazendo com que a revolta não fosse às vias de fato. O vigário foi preso e enviado à Vila de São João del-Rei.
Fazenda Campo Alegre
A Fazenda Campo Alegre pertencia ao deputado Gabriel Francisco Junqueira e em 1839 possuía 103 escravizados para cuidar do gado e do plantio. Em 1868, ano da morte do deputado, a escravidão ainda era considerável, 92 pessoas escravizadas.
Fazenda Bela Cruz
A Fazenda Bela Cruz compreendia uma ampla região. A propriedade era cercada e dividida por muros de pedras. Entre os cômodos da fazenda incluía uma morada de casas de vivenda, senzalas cobertas de telhas, chiqueiro, currais e quintal com árvores de espinho, entre outros.
A Revolta de Carrancas trouxe à tona todo o aborrecimento dos negros, livres e escravos, e também mostrou a alta habilidade de organização e articulação deles.
O juiz de paz de Baependi, Antônio Gomes Nogueira Freire, tomou algumas medidas de prevenção, como por exemplo intensificar a vigilância em outras propriedades, principalmente naquelas onde havia um grande número de escravos.
Em 15 de maio de 1833, o juiz de paz de Pouso Alto avisou a Câmara Municipal de Resende sobre os acontecimentos de Carrancas, pois o grupo de revoltosos pretendia atacar outras fazendas.
Algumas regiões do Vale do Paraíba paulista, como Areias e Bananal, foram logo avisadas do que ocorrera em Carrancas. Como eram regiões com grande número de pessoas escravizadas, os vereadores foram intimados para uma sessão secreta no dia 21 de maio, onde ficou acordado uma série de medidas para evitar maiores repercussões da Revolta de Carrancas na região.
Os rebeldes de Carrancas foram severamente punidos. Dezesseis foram condenados à pena de morte por enforcamento e executados em praça pública com cortejo da Irmandade de Misericórdia na Vila de São João del-Rei.
Alguns foram condenados como cabeça da revolução, de acordo com o Artigo 113 do Código Criminal que determinava pena de morte para crimes assim. Outros foram punidos pelo crime de homicídio qualificado, segundo o Artigo 192 do mesmo código.
Essa foi uma das maiores penas coletivas à morte às quais foram condenadas pessoas escravizadas na história do Brasil. No caso da Revolta de Carrancas, apenas Antônio Resende, um dos escravizados de Gabriel Francisco Junqueira, conseguiu fazer chegar uma petição ao Imperador e teve a vida salva, pois ele foi o executor de seus companheiros. Primeiro, ele foi preso na cadeia de Ouro Preto, de onde acabou fugindo em 1835. Em julho de 1848, estava preso na cadeia de São João del-Rei e solicitou a mudança para a Santa Casa de Misericórdia para tratar inflamações e dores no peito. Foi identificado na petição como "Antônio Resende, o carrasco".
Entre os cabeças da revolta, destacam-se Ventura Mina (Campo Alegre), Joaquim Mina (Bela Cruz) e Damião (Campo Belo). O último se enforcou quando soube que fora denunciado.
O medo causado pela Revolta de Carrancas foi erradicado com a condenação das pessoas à pena de morte.
A Revolta de Carrancas teve grande impacto nas instâncias de poder da corte. Quatro projetos foram enviados à Câmara dos Deputados em 10 de junho de 1833. Um se referia ao julgamentos dos crimes de cometidos por escravizados. Esse projeto antecipava o texto da lei de 10 de Junho de 1835, que designou a pena de morte para pessoas escravizadas envolvidas no homicídio de seus senhores e parentes.
Fontes:
wikipedia.org
google.com
infoescola.com
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