sexta-feira, 2 de junho de 2023

Vamos falar da obra de Alfredo Maria Adriano d'Escragnolle Taunay,ou simplesmente Visconde de Taunay, Inocência.



Visconde de Taunay




Romance regionalista brasileiro publicado em 1872, retrata os costumes e ambientes de Paranaíba no Mato Grosso do Sul.






Capítulo I


Corta extensa e quase despovoada zona da parte sul-oriental da vastíssima Província de Mato Grosso a estrada que da Vila de Sant’Ana do Paranaíba vai ter ao sítio abandonado de Camapuã. Desde aquela povoação, assente próximo ao vértice do ângulo em que confinam os territórios de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso até ao Rio Sucuriú, afluente do majestoso Paraná, isto é, no desenvolvimento de muitas dezenas de léguas, anda-se comodamente, de habitação em habitação, mais ou menos chegadas umas às outras, rareiam, porém, depois as casas, mais e mais, caminham-se largas horas, dias inteiros sem se ver morada nem gente até ao retiro de João Pereira, guarda avançada daquelas solidões, homem chão e hospitaleiro, que acolhe com carinho o viajante desses alongados páramos¹ , oferece-lhe momentâneo agasalho e o provê da matalotagem precisa para alcançar os campos de Miranda e Pequiri, ou da Vacaria e Nioac, no Baixo Paraguai. Ali começa o sertão chamado bruto.

¹ - Local deserto e exposto às intemperes do tempo e da Natureza

Resumo


Sertão de Santana do Parnaíba, 1860. Pereira (Martinho dos Santos Pereira) vive na fazenda com Inocência, sua filha de 18 anos. Seu pai exige-lhe obediência total, num regime antigo e educada longe do mundo. Escolhe para ela o noivo, Manecão, um homem criado no sertão bruto, de índole violenta.

Maria Conga é escrava de Pereira. Tico é o guarda da moça Inocência, bastante fiel apesar de ser mudo. Um dia, Pereira encontrou-se com um rapaz que percorria os caminhos do sertão a medicar. Havia feitos estudos no colégio do Caraça e iniciado Farmácia em Ouro Preto. Chamavam-no de “doutor”, título que não menosprezava. Seu nome era Cirino Ferreira dos Santos (Dr. Cirino).


Nascera Cirino de Campos, como dissera a Pereira, na província de São Paulo, na sossegada e bonita Vila de Casa Branca, a qual demora umas 50 léguas do litoral. Filho de um vendedor de drogas, que se intitulava boticário e a esse oficio acumulava o importante cargo de administrador do correio, crescera debaixo das vistas paternas até a idade de doze anos completos, quando fora enviado, em tempos de festas e a título de recordações saudosas, a um velho tio e padrinho, morador na cidade de Ouro Preto. Esse parente, solteirão, de gênio rabugento, misantropo, e dado às práticas da mais extrema carolice, recebeu o pequeno com mau modo e manifesto descontentamento, tanto mais quanto à presença de um estranho vinha interromper os hábitos de completa solidão a que se acostumara desde longos anos. Era homem que trajava ainda à moda antiga, usando de sapatos de fivela, calções de braguilha, e cabeleira empoada com o competente rabicho. A sua reputação de pessoa abastada era, em toda a cidade de Ouro Preto, tão bem firmada quanto a de refinado sovina, chegando a voz público a afirmar que o seu dinheiro, e não pouco, estava todo enterrado em numerosos buracos no chão da alcova de dormir. (p.8)


Inocência estava doente de “uma febre braba” e o “doutor” curou-a . Os dois apaixonaram-se mais tarde: eram demasiados os cuidados que o “doutor” tinha para com ela. Amavam-se às escondidas e o laranjal era local de encontros proibidos. Pensavam que ninguém poderiam desconfiar… mas Tico, o anãozinho mudo, estava atento… Nesse ínterim, Pereira andava desconfiado do Dr. Meyer, um caçador de borboletas, que por lá aparecera!


—Sr. Cirino, eu cá sou homem muito bom de gênio, multo amigo de todos, muito acomodado e que tenho o coração perto da boca, como vosmecê deve ter visto... —Por certo, concordou o outro. —Pois bem, mas... tenho um grande defeito; sou muito desconfiado. Vai o doutor entrar no interior da minha casa e... deve portar-se como... —Oh, Sr Pereira! atalhou Cirino com animação, mas sem grande estranheza, pois conhecia o zelo com que os homens do sertão guardam da vista dos profanos os seus aposentos domésticos, posso gabar-me de ter sido recebido no seio de muita família honesta e sei proceder como devo. Expandiu-se um tanto o rosto do mineiro. —Vejo, disse ele com algum acanhamento, que o doutor não e nenhum pé-rapado, mas nunca é bom facilitar... E já que não há outro remédio, vou dizer-lhe todos os meus segredos... Não metem vergonha a ninguém, com o favor de Deus; mas em negócios da minha casa não gosto de bater língua... Minha filha Nocência fez 18 anos pelo Natal, e é rapariga que pela feição parece moça de cidade, muito ariscazinha de modos mas bonita e boa deveras... Coitada, foi criada sem mãe, e aqui nestes fundões. Tenho outro filho, este um latagão, barbudo e grosso que está trabalhando agora em porcadas para as bandas do Rio.(p.12)



Desconfiava a tal ponto que o ilustre entomólogo passou a ser “persona non grata”. Dr. Meyer tinha por objetivo descobrir espécimes novos para museus europeus. Respeitava com muito carinho e muita atenção a bonita Inocência. José Pinho (Juque), ajudante de Dr. Meyer, explicava a função de seu patrão: procurar insetos. E isso durante quase dois anos…

Garcia, leproso, aparece na fazenda do Sr. Pereira. Quer falar com Dr. Cirino. O “médico” diz-lhe que a doença e incurável e contagiosa.

Inocência foi maltratada pelo pai, quando este soube de seu amor com o doutor. Foi atirada contra a parede. Resistiu e jurou não se casar com Manecão, o sertanejo violento. Mas o pai – Sr. Pereira – achou que a filha estava de “mau olhado”, por causa do Dr. Meyer.



Descrever o abalo que sofreu Inocência ao dar, cara a cara com Manecão fora impossível Debuxaram-se-lhe tão vivos na fisionomia o espanto e o terror, que o reparo, não só da parte do noivo, como do próprio pai, habitualmente tão despreocupado, foi repentino, —Que tem você? perguntou Pereira apressadamente. —Homem, a modos, observou Manecão com tristeza, que meto medo à senhora dona... Batiam de comoção os queixos da pobrezinha: nervoso estremecimento balanceava-lhe o corpo todo. A ela se achegou o mineiro e pegou-lhe no braço. —Mas você não tem febre?... Que é isto, rapariga de Deus? Depois, meio risonho e voltando-se para Manecão: —Já sei o que é... Ficou toda fora de si... vendo o que não contava ver... Vamos, Nocência, deixe-se de tolices. —Eu quero, murmurou ela, voltar para o meu quarto (p.56)


E encontrou uma solução: ele ou Manecão mataria o intruso alemão. Dr. Meyer não deu ouvidos a Pereira, zombado de sua ameaça. Tomou-se de vergonha: era ofensa demais. Tico, após testemunhar o amor existente entre Inocência e Cirino, explicou ao Sr. Pereira tudo que se passava…


—Mas quem é o Sr.? perguntou Cirino. —Eu? —Sim!... sim!... —Então não me conhece? —Não, balbuciou Cirino. —Conhece Nocência? uivou Manecão com voz terrível E de supetão tirando uma garrucha da cintura, desfechou-a à queima-roupa em Cirino. Varou a bala o corpo do infeliz e o fez baquear por terra. Dois gritos estrugiram. Um de agonia, outro de triunfo. Ficara Cirino estendido de bruços. Reunindo as forças, que se lhe escapavam com o sangue, voltou-se de costas e prorrompeu em vociferações contra o inimigo, que o contemplava sardônico. —Matador!. vil! .. sim! .. conheço Inocência... Ela é minha .. Infame! (p.65)


Manecão começou a seguir os passos de Cirino. Até um dia interpelou-o . Tirou uma garrucha da cintura e… Cirino caiu por terra, pedindo água e sussurrando o nome de Inocência. Agonizante, exigia do mineiro Antônio Cesário que não deixasse Inocência casar-se com Manecão…



—Eu? .. Casar com o senhor?! Antes uma boa morte!... Não quero... não quero... Nunca... Nunca... Manecão bambaleou. Pereira quis por-se de pé, mas por instantes não pôde. —Está doida, balbuciou, está doida. E, segurando-se à mesa, ergueu-se terrível. —Então, você não quer? perguntou com os queixos a bater de raiva. —Não, disse a moça com desespero, quero antes... Não pode terminar. O pai agarrara-a pela mão, obrigando-a a curvar-se toda. Depois, com violento empurrão, arrojou-a longe, de encontro à parede. Caiu a infeliz com abafado gemido e ficou estendida por terra, amparando o peito com as mãos. Mortal palidez cobria-lhe as faces e de ligeira brecha que se abrira na testa deslizavam gotas de sangue Ia Pereira precipitar-se sobre ela como para esmagá-la debaixo dos pés, mas parou de repente e, levando as mãos ao rosto, ocultou as lágrimas que dos olhos lhe saltavam a flux. Manecão não fizera o menor gesto. Extático assistira a toda essa dolorosa cena. A fisionomia estava impassível, mas, por dentro, seu coração era um vulcão. Lúgubre silencio reinou por algum tempo naquela sala. O anão chegara-se a Inocência, tomando-lhe uma das mãos: depois, a fizera sentar e, no meio de carinhos, mostrara-lhe por sinais a necessidade de retirar-se. A custo pôde ela seguir aquele conselho. Quase de rastos e ajudada por Tico é que saiu da presença do pai e de seu perseguidor (p.62)




Dr. Guilherme Tembel Meyer, em 1863, apresentava aos entomólogos do mundo a sua mais recente descoberta: uma borboleta até então desconhecida: “Papilio Innocentia:” em homenagem à Inocência, a moça do sertão de Santana do Paranaíba, da Parte sul oriental do Mato Grosso.

Inocência, coitadinha…

Exatamente nesse dia dois anos faria que seu gentil corpo fora entregue à terra, no intenso sertão de Santana do Parnaíba, para dormir o sono da eternidade…(p.67)



Fontes:

mundovestibular.com.br
objdigital.bn.br
wikipedia.org
google.com


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