quarta-feira, 24 de julho de 2024

 O Grande Mentecapto - Fernando Sabino.





O romance o Grande Mentecapto foi publicado em 1979, conta a história de Viramundo, uma espécie de Dom Quixote do século XX.






O início do livro mostra que Geraldo foi um menino como qualquer outro, tivera suas maluquices e peraltices, porém a história se desenvolve a partir das consequências de uma aposta entre Viramundo e seus amigos de que conseguiria fazer o trem parar em seu município, já que Rio Acima (a cidade do menino) não era originalmente ponto de sua parada. A narrativa apresenta diversas referências quixotescas, e de modo cômico e emocionante retrata como a vida pode surpreender quando menos se espera.

"O trem não parava em Rio Acima naquela época. Mas ainda assim sua existência era um deslumbramento para a molecada. Todos sabiam exatamente a hora que ele passava, iam postar-se na estrada, no alto dos barrancos, junto à cerca de arame farpado, a esperá-lo, grandioso espetáculo diariamente repetido. Apostavam para saber quem é que iria vê-lo primeiro, colavam o ouvido nos trilhos para ouvir o ruído das rodas. Assim que alguém dava o alarme, todos se co-locavam em posição e dentro em pouco uma fumacinha apontava longe, rolava no ar um ruído em crescendo e finalmente a locomotiva surgia lá embaixo, na curva da estrada. - Hoje não apitou na curva! - um deles protestava, sem tirar os olhos da máquina. E o trem passava como um raio, num estrondo de ensurdecer, cobrindo o céu de fumaça, agitando loucamente as plantinhas das margens, fazendo os dormentes estremecerem no cascalho negro da estrada.'' (Cap. I p.8)




Fernando Sabino




No âmbito literário brasileiro, O Grande Mentecapto, de Fernando Sabino, é um romance contemporâneo no qual é possível perceber a presença de elementos típicos da literatura carnavalizada (gênero que satiriza a sociedade através dos diálogos do povo, usando técnicas narrativas). Assim, é um romance do nosso tempo, que dialoga também com a tradição da sátira carnavalizada, a sua filiação no passado, de onde provém a sua linhagem. Essa duplicidade de referências, que, à primeira vista, pode parecer contraditória é, na verdade, a singularidade da obra. Por isso, esse trabalho busca compreender melhor como se dá a relação entre a contemporaneidade e a carnavalização na construção de O Grande Mentecapto.


O romance em questão foi publicado originalmente em 1979 e é considerado o best seller do autor, possuindo, somente pela Editora Record, mais de 70 edições até o ano de 2013. Além disso, ele rendeu a Fernando Sabino o Prêmio Jabuti, e também foi adaptado para o cinema — por Osvaldo Caldeira, em 1987 — e para o teatro. Mesmo tratando-se de um sucesso literário e sendo reconhecido por alguns autores como obra carnavalizada, o romance ainda não recebeu muitos estudos acadêmicos e não foi muito discutido pela crítica. Diante da necessidade de apontar o lugar dessa obra na série literária brasileira, o estudo tentará mostrar a importância desse romance, que, ao filiar-se à tradição carnavalizada, mesclando seus elementos com os da literatura contemporânea, é capaz de representar aspectos da cultura brasileira e problematizar questões universais próprias da natureza do ser humano. Em relação ao contexto histórico, na época da publicação da obra, a sociedade brasileira passava por uma crise política. Após 15 anos de ditadura militar, em 1979, sob o governo de João Batista Figueiredo, esse regime inicia um lento e gradual processo de decadência com a implantação da Lei nº 6.683, popularmente conhecida como Lei da Anistia. Nessa época, o Brasil possuía uma economia dependente e uma sociedade diversificada que, juntamente com o avanço tecnológico, tinha de conviver com a miséria e o analfabetismo. Diante de tal realidade, surgem obras como a poesia marginal da década de 70 e, na prosa, os relatos de vida de ex-combatentes da ditadura juntamente com a ficção alegórica. Do ponto de vista formal, as narrativas brasileiras dessa época apoiam-se no reflexo cotidiano desse contexto e tematizam questões que repercutem o inconsciente coletivo. Vale ressaltar, porém, que este trabalho não objetiva realizar um estudo aprofundado e inesgotável das relações entre a narrativa de O Grande Mentecapto e esse contexto histórico brasileiro, mas, ainda assim, tais relações serão estabelecidas nos momentos em que a sátira a esse período for mais intensa. Percebe-se também que essas narrativas têm como características a presença da intertextualidade, da ironia, da fragmentação, do questionamento do racionalismo, da polifonia, do humor, do lúdico e da autoconsciência, por exemplo. O Grande Mentecapto apresenta esses traços típicos da contemporaneidade, unindo-os aos componentes da literatura carnavalizada. O carnaval e a carnavalização são elementos que fazem parte da realidade humana. Bakhtin (1999) afirma que, na Idade Média, havia rituais carnavalescos que chegavam a durar até três meses e eram considerados a segunda vida do povo. Esses rituais guardam certa semelhança com o carnaval ainda existente e, segundo Bakhtin (1999), têm como principais características o caráter não oficial, a abolição das relações hierárquicas, o contato livre e familiar, além do princípio cômico.



Ambientado no estado de Minas Gerais, onde aliás, percorremos várias cidades mineiras durante a leitura. A começar pela cidade Natal do nosso protagonista, Rio Acima. Viramundo é uma criança simples, de uma família pobre e muito ativo em sua infância. E sua primeira grande travessura foi a de obrigar um trem a fazer uma parada forçada, só para provar que conseguiria tal feito. O que antes parecia uma brincadeira ousada de criança acaba virando uma tragédia. Após isso, Viramundo demonstra o desejo de ser padre e entra para o seminário. Mas as andanças do nosso protagonista, sonhador, ingênuo e aventureiro, não param por aí. Geraldo Viramundo acaba viajando por quase todo estado de Minas Gerais e em cada cidade que passa, ele vive um caso diferente, provocando as mais inusitadas confusões e enrascadas.

“O raio que coriscou na sua cabeça naquele instante, dando-lhe uma fulminante consciência da iniquidade que prevalece neste mundo, foi demais para a sua inocência, matou o menino que ele trazia dentro de si. Matou o menino.”



Geraldo cresce e se dá conta de que sua forma de encarar o mundo está se transformando. Já rapaz, se interessa em saber os detalhes da vida religiosa, até decidir entrar para o seminário, em Mariana.

Mas ele sai do seminário e dá continuidade a uma vida cheia de aventuras e reviravoltas : passa pelo hospício, pelo Exército, pela política, apaixona-se - mas não consegue se encaixar em nenhuma dessas realidades. Ele então avança na sua jornada, passando por Ouro Preto, Barbacena, Juiz de Fora, Uberaba, Cataguases e tantas outras cidades mineiras, envolvendo-se em divertidas peripécias , até encerrar sua jornada em Belo Horizonte, capital do estado.

Apesar dos mal-entendidos com os quais se envolve, Viramundo é um cidadão bem-intencionado, que faz o bem e acredita nas pessoas , mas em várias ocasiões é usado por elas. No dicionário, “mentecapto” significa aquele que é desajustado, alienado, que perde o juízo. A empatia com o personagem é imediata ; ele desperta a compaixão de quem entende a dificuldade de se enquadrar no mundo dito normal, diante de tanto descaso, ironia e cobranças.

Alguns críticos compararam Geraldo Viramundo a um personagem de um dos grandes clássicos literários mundiais: Dom Quixote , o protagonista do romance escrito pelo espanhol Miguel de Cervantes. De fato, tanto Quixote quanto Viramundo têm em comum o caráter humanista, sonhador, aventureiro . Muitas vezes parecem alucinados, procurando um lugar no mundo que possa tornar sua existência mais repleta de sentido.

Assim como a obra de Cervantes, O grande mentecapto faz uma série de referências a outras obras e autores, além de apresentar personagens complexos e bem construídos, fazendo com que o leitor se envolva nessa história hilariante e dramática, com interesse e curiosidade. É um dos grandes romances da literatura brasileira.


Fontes:

wikipedia.org
google.com
bibliotecapublica.mg.gov.br
repositorio.unesp.com
doceru.com
observatoriodaimprensa.com.br
amazon.com.br
O grande mentecapto - Sabino, Fernando - 1979

terça-feira, 23 de julho de 2024

 A casa dos espíritos de Isabel Allende.







Se pai foi primo de Salvador Allende, morto no golpe de 1973. Com isso ela e a família foram obrigados a deixar o Chile.


Isabel Allende


A Casa dos Espíritos foi o primeiro romance de Isabel  e foi publicado em 1982.




Capítulo I

Rosa, a Bela

"Barrabás chegou à família por via marítima, anotou a menina Clara com a sua delicada caligrafia. Já nessa altura tinha o hábito de escrever as coisas importantes e, mais tarde, quando ficou muda, escrevia também as trivialidades, sem suspeitar que cinquenta anos depois os seus cadernos me iriam servir para resgatar a memória do passado e sobreviver ao meu próprio espanto.

O dia em que chegou Barrabás era Quinta-Feira Santa. Vinha numa jaula indigna, coberto dos próprios excrementos e de urina, com um olhar extraviado de preso miserável e indefeso, adivinhando-se, porém, pelo porte real da cabeça e pelo tamanho do esqueleto o gigante lendário que veio a ser. Era um dia aborrecido e outonal, que em nada fazia imaginar os acontecimentos que a menina registou para serem recordados e que ocorreram durante a missa das doze, na paróquia de San Sebastián, à qual assistiu com toda a família... ''




O livro faz parte do movimento conhecido como Realismo Fantástico – escola literária latino-americana caracterizada pela, entre outras coisas, inserção de elementos fantásticos em situações cotidianas – neste caso, personificado nos poderes sobrenaturais que Clara desenvolve após fazer um voto de silêncio depois de um evento traumático. Os protagonistas da história são as mulheres da família Trueba – Clara, Blanca e Alba: mãe, filha e neta, respectivamente – e o patriarca, Esteban.

Após se casarem, Esteban e Clara passam a morar numa antiga fazenda da família dele, Las Trés Marias, a qual com o passar dos anos se transforma em um grande império latifundiário – o que o leva a se filiar e conquistar cargos eletivos pelo Partido Conservador. Para total desgosto de seu pai, Blanca, além de simpatizar com ideias de esquerda, engravida e se casa com Pedro Garcia III: um líder camponês que milita pela causa da reforma agrária. O clímax do livro ocorre após o Partido Conservador perder ineditamente uma eleição para a Frente Popular de Esquerda, que sofre um violento golpe de estado após chegar ao poder. Entre outros personagens de destaque para a trama estão: Férula, irmã de Esteban que também vive na fazenda com a família; Jaíme e Nicolas, filhos de Clara e Esteban; Transíto Soto, amante de Esteban; e Miguel, namorado de Alba. O livro é repleto de fortes personagens femininas, cuja antítese se materializa na figura truculenta e misógina de Esteban – algo evidenciado pelo estremecimento crescente com as mulheres de sua família ao longo da trama.







A casa dos espíritos traz a luta de quatro gerações de mulheres de uma mesma família em meio às práticas sociais, culturais e sociais nas quais os homens controlam a vida das mulheres brancas, por meio de casamentos arranjados para conceber descendentes para perpetuar a família e preservar o patrimônio, e das mulheres camponesas, por meio de exploração sexual e de serviço braçal.



O livro se mostra uma leitura bastante necessária para refletir sobre feridas ainda abertas na história latino-americana: como a formação patriarcal, personificada na figura de Esteban, e tendo como contraponto a conduta feminista de sua filha e de sua neta; a concentração fundiária, descrita na gênese de Las Trés Marias, que inclusive contava com condições de trabalho análogas à escravidão; e principalmente os golpes e ditaduras militares, e toda repressão violência política inerente a eles. A trama é complexa, contando com vários personagens e minuciosos detalhes, e narrada em primeira pessoa pelas mulheres da família Trueba. O livro aborda a violência de gênero e o papel da mulher na sociedade ocidental do século XX, período marcado por avanços nos direitos civis das mulheres, esta questão é retratada pelos desafios enfrentados pelas mulheres ao longo da trama – o teor feminista da obra inclusive fica evidente na dedicatória do livro, homenageando as mulheres da família Allende. De modo bem singular, o livro é capaz de traçar um interessante retrato dos comportamentos e costumes latino-americanos ao longo do século XX, bem como mudanças políticas e sociais no decorrer deste período, estes temas colocados sob a ótica de Isabel Allende, analisando e explorando fatos tão vulneráveis que ocorreram num passado recente de distintos países (e realidades) da América do Sul é que tornam a obra tão importante.






Em 1983 a história foi levada ao cinema, com direção de Bille August, tendo no elenco: Antonio Banderas, Glen Close, Winona Ryder, Jeremy Irons e Meryl Streep.



Fontes:

letras.biblioteca.ufrj.br
wikipédia.org
google.com
unifal-mg.edu.br
interfilmes.com

sexta-feira, 19 de julho de 2024

 Palavras Homógrafas e palavras Homófonas.







Na língua portuguesa existem palavras homófonas, que são aquelas que apresentam a mesma fonética, mas com escritas e significados diferentes, e palavras homógrafas, que são aquelas escritas de forma igual, mas com significados e pronúncias diferentes.


Exemplo de homófonos:

• SENSO: refere-se ao sentido e a capacidade de entender e julgar. “Adoro o seu senso de humor!”



• CENSO: refere-se ao recenseamento, ou seja, à contagem e ao levantamento de dados referente a um conjunto de pessoas. “Com base no censo, poderemos verificar a média de idade da população brasileira”.


Outros exemplos : 

Traz a minha mochila, por favor!” (verbo trazer)

“Está na parte de trás do sofá.” (local posterior)

“Você tem cem reais para me emprestar?” (numeral)

“Estou sem tempo hoje.” (indicando falta)

Houve um assalto na rua ontem.” (verbo haver)

“Meu avô não ouve muito bem.” (verbo ouvir)

“Eu levei a máquina ao conserto.” (reparação)

“Nós fomos ao concerto no Teatro Municipal.” (espetáculo musical)

“A palavra água leva acento agudo.” (sinal gráfico)

“Ela cedeu o assento ao senhor.” (lugar para sentar)




Exemplo de homógrafos:

• COMEÇO: do verbo começar. “Eu começo esta petição agora, mas só termino amanhã”.



• COMEÇO: do substantivo início. “O advogado leu o começo da sentença e ficou feliz”.


Outros exemplos:

“Ela adora blusas de cor vermelha.” (coloração)
“O menino sabe o hino de cor.” (memória)

“O gosto dessa sopa não está muito bom.” (sabor)
“Eu gosto de sair aos sábados.” (verbo gostar)

“Ela chegou da corrida com muita sede.” (vontade de beber)
“Os jogadores fizeram sua apresentação na sede do clube.” (matriz)

“Vocês estão conversando sobre o quê?” (acerca de)
“Não quero que sobre comida no seu prato.” (verbo sobrar)

“É preciso esquentar o molho do macarrão.” (líquido, caldo)
“Eu molho as plantas todos os dias.” (verbo molhar)



Ter conhecimento sobre a ortografia é extremamente importante na elaboração de textos a fim de que a mensagem seja transmitida de forma clara e o leitor possa interpretar corretamente o que está escrito.




Fontes:

fonsattifranzin.com.br
projetoredacao.com.br
google.com

quinta-feira, 18 de julho de 2024

Guerra do Contestado


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A Guerra do Contestado foi um conflito armado entre a população cabocla e os representantes do poder estadual e federal brasileiro travado entre outubro de 1912 e agosto de 1916, numa região rica erva-mate e madeira, disputada pelos estados brasileiros do Paraná e de Santa Catarina.






Originada nos problemas sociais, decorrentes principalmente da falta de regularização da posse de terras e da insatisfação da população hipossuficiente, numa região em que a presença do poder público era pífia, o embate foi agravado ainda pelo fanatismo religioso, expresso pelo messianismo e pela crença, por parte dos caboclos revoltados, de que se tratava de uma guerra santa.












A região fronteiriça entre os estados do Paraná e Santa Catarina recebeu o nome de Contestado devido ao fato de que os agricultores contestaram a doação que o governo brasileiro fez aos madeireiros e à Southern Brasil Lumber & Colonization Company, do magnata norte-americano, Percival Farquhar.  Como foi uma região de muitos conflitos, ficou conhecida como Contestado, por ser uma região de disputas de limites entre os dois estados brasileiros. O governo brasileiro doou à Companhia Lumber, quinze quilômetros de cada lado  da estrada de ferro, considerando serem terras devolutas. Essas terras, no entanto, eram habitadas por posseiros pobres, cujas terras, eram seu único modo de sobrevivência.



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Para entender-se bem a guerra sertaneja , é preciso voltar um pouco no tempo e resgatar o valor da figura de três monges da região. O primeiro monge que galgou fama foi o Monge João Maria de Agostini, um rezador leigo de origem italiana, que peregrinou pregando e atendendo doentes de 1844 a 1870 por um amplo território que ia de Sorocaba, em São Paulo, até Rio Pardo e Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Fazia questão de viver uma vida extremamente humilde, e sua ética e forma de viver arrebanhou milhares de crentes, reforçando o messianismo coletivo. Sublinhe-se, porém, que não exerceu influência direta nos acontecimentos da Guerra do Contestado que ocorreria posteriormente. João Maria morreu em 1870, em Sorocaba, estado de São Paulo.







O segundo monge adotou o codinome (alcunha) de João Maria mas seu verdadeiro nome era Atanás Marcaf, provavelmente de origem síria. Aparece publicamente com a Revolução Federalista de 1893, mostrando uma postura firme e uma posição messiânica. Sobre sua situação política, dizia ele "estou do lado dos que sofrem". Chegou, inclusive, a fazer previsões sobre os fatos políticos da sua época. Atuava na região entre os rios Iguaçu e Uruguai. É de destacar a sua influência inquestionável sobre os crentes, a ponto destes esperarem a sua volta através da ressurreição, após seu desaparecimento em 1908. Assim como acreditavam os portugueses na volta de D. Sebastião, morto na batalha de Alcácer Quibir em 1581.


D.Sebastião





As entrelinhas do que estava por vir estavam se amarrando entre si. A espera dos fiéis acabou em 1912, quando apareceu publicamente a figura do terceiro monge. Este era conhecido inicialmente como um curandeiro de ervas, tendo se apresentado com o nome de José Maria de Santo Agostinho, ainda que, de acordo com um laudo da polícia da Vila de Palmas, Estado do Paraná, ele fosse, na verdade, um soldado desertor condenado por estupro, de nome Miguel Lucena de Boaventura.





José Maria pregava uma vida de respeito ao próximo, aos animais e à natureza, assinalava a existência de fontes de água (que logo a população passou a chamar de "águas santas" ou "águas do monge") e recomendava a edificação de cruzeiros.


Como ninguém conhecia ao certo a sua origem, como aparentava uma vida reta e honesta, não lhe foi difícil granjear em pouco tempo a admiração e a confiança do povo. Um dos fatos que lhe granjearam fama foi a presunção de ter ressuscitado uma jovem (provavelmente apenas vítima de (catalepsia patológica). Supostamente também recobrou a saúde da esposa do coronel Francisco de Almeida, acometida de uma doença incurável. Com este episódio, o monge ganha ainda mais fama e credibilidade ao rejeitar terras e uma grande quantidade de ouro que o coronel, agradecido, lhe queria oferecer.

A partir daí, José Maria passa a ser considerado santo: um homem que veio à terra apenas para curar e tratar os doentes e necessitados. Metódico e organizado, estava muito longe do perfil dos curandeiros vulgares. Sabia ler e escrever e anotava em seus cadernos as propriedades medicinais das plantas encontradas na região. Com o consentimento do coronel Almeida, montou no rancho de um dos capatazes o que chamou de farmácia do povo, onde fazia o depósito de ervas medicinais que utilizava no atendimento diário, até horas tardias da noite, a quem quer que o visitasse.


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Após a conclusão das obras do trecho catarinense da Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande, a companhia Brazil Railway Company,  que recebeu do governo 15 km de cada lado da ferrovia, iniciou a desapropriação de 6.696 km² de terras (equivalentes a 276.694 alqueires) ocupadas já há muito tempo por posseiros que viviam na região entre o Paraná e Santa Catarina.


O governo brasileiro, ao firmar o contrato com a Brazil Railway Company, declarou a área como devoluta, ou seja, como se ninguém ocupasse aquelas terras. "A área total assim obtida deveria ser escolhida e demarcada, sem levar em conta sesmarias nem posses, dentro de uma zona de trinta quilômetros, ou seja, quinze para cada lado". Isso, e até mesmo a própria outorga da concessão feita à Brazil Railway Company, contrariava a chamada Lei de Terras de 1850.  Não obstante, o governo do Paraná reconheceu os direitos da ferrovia; atuou na questão, como advogado da Brazil Railway, Affonso Camargo, então vice-presidente do estado.


Affonso Camargo




O "santo monge" José Maria rebelou-se, então, contra a recém formada república brasileira e decidiu dar status de governo independente à comunidade que comandava. Para ele, a república era a "lei do diabo", Antonio Conselho, de Canudos, também era contra a república. 

Antonio Maria, nomeou "imperador do Brasil" um fazendeiro analfabeto, nomeou a comunidade de "Quadro Santo" e criou uma guarda de honra constituída por 24 cavaleiros que intitulou de "Doze Pares de França", numa alusão à cavalaria de Carlos Magno na Idade Média.


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O governo brasileiro, então comandado pelo marechal Hermes da Fonseca, responsável pela Politica de Salvações, caracterizada por intervenções político-militares que em diversos Estados do país pretendiam eliminar seus adversários políticos, sentiu indícios de insurreição neste movimento e decidiu reprimi-lo, enviando tropas para "acalmar" os ânimos.


Antevendo o que estava por vir, José Maria parte imediatamente para a localidade de Irani com todo o seu carente séquito. A localidade nesta época pertencia à Palmas, cidade que estava na jurisdição do Paraná, e que tinha com Santa Catarina questões jurídicas não resolvidas por conta de divisas territoriais, e acabou vendo nessa grande movimentação uma estratégia de ocupação daquelas terras.

A guerra do Contestado inicia-se neste ponto: em defesa de suas terras, várias tropas do Regimento de Segurança do Paraná são enviadas para o local, a fim de obrigar os invasores a voltar para Santa Catarina. 




Em 22 de outubro de 1912, a polícia do Paraná deu início a um ataque que resultou na batalha do Irani, em um lugar chamado "Banhado Grande", na qual morreram 11 sertanejos, entre eles o monge José Maria, e 10 soldados, inclusive o coronel João Gualberto Gomes de Sá Filho

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Um ano após o primeiro combate, uma menina de 11 anos, chamada Teodora, passou a relatar que tinha sonhos com José Maria e que este ordenava a todos os seus seguidores a dirigirem-se para Taquaruçu. Depois formam-se outras "cidades santas" ou redutos dos sertanejos, como Caraguatá, Santo Antônio, Caçador Grande, Bom Sossego, Santa Maria (a maior cidade, com mais de 20 mil habitantes), Pedra Branca, São Miguel e São Pedro.


Em 8 de fevereiro de 1914, numa ação conjunta de Santa Catarina, Paraná e governo federal, foi enviado a Taquaruçu um efetivo de 700 soldados, apoiados por peças de artilharia e metralhadoras. Estes logram êxito na empreitada, incendeiam completamente o acampamento dos jagunços, mas sem muitas perdas humanas, já que os caboclos e fiéis da causa do Contestado se refugiaram em Caraguatá, local de difícil acesso e onde já viviam cerca de 20.000 pessoas.

Os fiéis que mudaram para Caraguatá, interior do atual município de Leblon Régis, eram chefiadas por Maria Rosa, uma jovem com quinze anos de idade, considerada pelos fiéis como ''uma Joana  D' Arc do sertão, já que "combatia montada em um cavalo branco com arreios forrados de veludo, vestida de branco, com flores nos cabelos e no fuzil".






Após a morte de José Maria, Maria Rosa afirmava receber, espiritualmente, ordens do mesmo, o que a fez assumir a liderança espiritual e militar de todos os revoltosos, então cerca de 6.000 homens.
Com o passar do tempo, general Fernando Setembrino de Carvalho adotou  uma nova postura de guerra, evitando o combate direto, que era o que os revoltosos esperavam e para o que estavam se preparando, optando por cercar o reduto dos fanáticos com tropas por todos os lados, evitando que entrassem ou saíssem da região onde estavam. Para isto, o general dividiu seu efetivo em quatro alas com nomes dos quatro pontos cardeais e, gradativamente, foi avançando e destruindo qualquer resistência que encontrasse pelo caminho.

Com esta nova ''estratégia, rapidamente começou a faltar comida nos acampamentos dos revoltosos. Isto teve como consequência imediata a rendição de dezenas de caboclos. Contudo, a maioria dos que se entregavam eram velhos, mulheres e crianças - talvez uma contra estratégia dos fiéis para que sobrasse mais comida aos combatentes que ficaram para trás e que ainda defenderiam a causa.


Neste ponto da guerra do Contestado, começa a se destacar a figura de Deodato Manuel Ramos, vulgo "Adeodato", considerado pelos historiadores como o último líder dos contestadores. Adeodato transferiu o núcleo dos revoltosos para o vale de Santa Maria, que contava ainda com cerca de 50.000 homens. Só que aí, à medida que ia faltando o alimento, Adeodato passou a revelar-se cada vez mais autoritário, não aceitando a rendição. Aos que se entregavam, aplicava sem dó a pena de morte.

Adeotado, preso



Cerco fechado, sem pressa e deixando os revoltosos nervosos lutarem contra si mesmos, em 8 de fevereiro de 1915 a ala Sul, comandada pelo tenente-coronel Estillac, chegou a Santa Maria. De um lado as forças do governo, bem armadas, bem alimentadas, de outro, rebeldes também armados, mas famintos e sem ânimo para resistir muito tempo. A luta inicial foi intensa e, à noite, o tenente-coronel ordenou a retirada, afinal, já contabilizara só no seu lado 30 mortos e 40 feridos.
Essa foi a primeira vez que o Exército Brasileiro usou aviões planadores na guerra.





Em dezembro de 1915, o último dos redutos dos revoltosos foi devastado pelas tropas de Setembrino. Adeodato fugiu, vagando com tropas no seu encalço. Conseguiu, no entanto, escapar de seus perseguidores e, como foragido, ficou ainda 8 meses escondendo-se pelas matas da região. Mas a fome e o cansaço, além de uma perseguição sem trégua, fizeram com que Adeodato se rendesse. Encerrava-se então, em agosto de 1916, com a prisão de Adeodato, a Guerra do Contestado.

Adeodato foi capturado e condenado a 30 anos de prisão. Entretanto, em 1923, 7 anos após ter sido preso, Adeodato foi morto pelo próprio diretor da cadeia numa tentativa de fuga.




Fontes:

brasilescola.uol.com.br
wikipedia.org
google.com
redesuldenoticiais.com.br
mundoeducacao.uol.com.br
todamateria.com.br

quarta-feira, 17 de julho de 2024

 

Maria Moura



Maria Lacerda de Moura nasceu em 1887, na fazenda Monte Alverne, em Manhuaçu, na então província de Minas Gerais. Em 1891, aos 4 anos de idade, mudou-se com seus pais e irmãos para a cidade de Barbacena, onde o seu pai conquistou um cargo como oficial no Cartório de Órfãos, enquanto a mãe dedicava-se à produção de doces. Começou seus estudos no externato administrado por freiras no Asilo de Órfãos da cidade e, aos 12 anos, matriculou-se na Escola Normal Municipal de Barbacena.


Sua família professava o espiritismo e adotava posições anticlericais, motivo pelo qual "recebeu o tratamento de minoria perigosa que os bispos mineiros reservavam para os protestantes e os espiritualistas de várias tendências". Segundo Miriam Lichfitz Moreira Leite, apesar do discurso cientificista e positivista adotado pelo Estado brasileiro durante a Primeira República, a Igreja Católica em Minas Gerais manteve "o seu domínio sobre o comportamento da família" e suas "articulações com a educação e a política", conservando "um lugar predominante" na educação pública até 1906.

Educadora em Barbacena e primeiros escritos

Formou-se professora pela Escola Normal Municipal de Barbacena em 1904 e em 1908, foi diretora do Pedagogium. Como educadora, Maria Lacerda engajou-se nos esforços oficiais para enfrentar o analfabetismo através das campanhas nacionais de alfabetização e reformas educacionais, participando da Campanha Barbacense de Alfabetização e de trabalhos beneficentes na cidade.

Em 1912, enviou as suas primeiras crônicas para um jornal local. Logo após as suas primeiras publicações — de acordo com uma autobiografia publicada no periódico O Combate em agosto de 1929 —, Maria Lacerda iniciou uma "luta de ideias" com um familiar, que a censurava pedindo "mais moderação" e lhe afirmava que "certas verdades não se dizem" Em 1918, publicou o seu primeiro livro, Em torno da educação, constituído de crônicas e conferências que realizou em Barbacena sobre o tema, e a partir do qual estabeleceu contatos com intelectuais de Belo Horizonte, São Paulo, Santos e Rio de Janeiro. No mesmo período, iniciou correspondências com José Oiticica e Galeão Coutinho e conheceu as ideias pedagógicas da médica Maria Montessori e dos educadores Paul Robin, Sebastien Faure e Francisc Ferrer y Guardia.

Ela foi entrevistada em 1928, pela escritora Raquel de Queirós, que estava escrevendo o romance " Memorial de Maria Moura", que falava sobre uma mulher nordestina que passou de sinhazinha para cangaceira.  Raquel de Queirós queria dar à personagem uma visão de mulher forte e decidida.






Ainda em Barbacena, Maria Lacerda esteve ligada a associações femininas e feministas. De acordo com a sua biógrafa Miriam Lichfitz Moreira Leite, Maria Lacerda "manifestara sua preocupação com a condição feminina e com as maneiras de transformá-la" desde 1919 e, nesse sentido, procurou "resolver o problema dos menores abandonados em Barbacena, despertando o interesse das alunas para a população desprovida de recursos" e divulgou "as iniciativas associativas de alguns movimentos feministas de que tinha notícia pelos periódicos das cidades maiores", incluindo os movimentos sufragistas do Rio de Janeiro e do exterior. Ao "entusiasmo pela defesa dos direitos da mulher à cidadania", Maria Lacerda uniu "o interesse pelo estudo da condição feminina". Seus escritos em Barbacena mantiveram a atenção voltada aos acontecimentos das grandes cidades, de onde vinham os periódicos, e enquanto "escrevia ou falava a suas alunas, estava frequentemente revelando as informações que as capitais lhe forneciam".

Em 1919, publicou Renovação e realizou as suas primeiras conferências fora de sua cidade. Em 1920, discursou na sede da Federação Operária Mineira (FOM) em Juiz de Fora e, em 1921, realizou uma conferência na cidade de Santos. Nas palavras de sua biógrafa, essas conferências "estabelecerão as pontes para a saída de Maria Lacerda de Barbacena".




Maria Lacerda de Moura se definia como intelectual, pacifista e feminista. Na imprensa, escreveu sobre os movimentos em que militou sem deixar de criticá-los: o feminismo, por não acolher mulheres negras e pobres; o comunismo, por pregar hierarquias excessivas no governo; o anarquismo, por ser tão radical a ponto de não aproveitar boas estratégias de outros sistemas políticos. A descrição poderia ser a de muitas jovens de hoje, mas pertence a uma mulher que viveu no século passado, e que foi uma das primeiras feministas do Brasil.

Nascida há 130 anos, em Manhuaçu (MG), Lacerda partia das próprias reflexões sobre a opressão da mulher para lutar contra outras formas de opressão, como a de classe. Por seu destaque como porta voz e crítica destes movimentos, chegou a ser conferencista tanto no Brasil quanto em outros países da América do Sul, tratando de temas polêmicos naquele contexto e ainda hoje, como direitos femininos, maternidade compulsória, antifascismo, amor livre e antimilitarismo.

“Seus escritos trazem questões datadas e também questões ainda muito atuais”, escreveu, em um artigo, a professora Miriam Moreira Leite, estudiosa da vida de Lacerda e diretora do documentário Maria Lacerda de Moura – Trajetória de uma Rebelde (2003).

Moreira Leite afirma que a luta da feminista centrava-se no “esclarecimento da mulher sobre sua situação de escrava da família e do marido, ou sua marginalização como solteirona ou prostituta”, e era posta em prática pela ideia de que as mulheres e as classes oprimidas em geral só conseguiriam qualquer tipo de emancipação quando alcançassem a liberdade intelectual: “Enquanto não souber pensar [a mulher] será instrumento passivo em favor das instituições do passado. E ela própria, inconsequente, trabalhará pela sua escravidão”, escreveu em 1922.

Esta emancipação intelectual era algo que ela mesma reconhecia, por experiência própria, como algo de difícil alcance. Por isso, esforçava-se para militar na esfera da educação, e falava, em seus textos, sobre tudo aquilo que julgava ser opressor: “Seus temas vão desde o Estado e o serviço militar obrigatório aos métodos de contracepção e a uma noção muito específica de amor”, explica a professora Ana Lúcia Ferraz, codiretora do documentário. “Sua posição diferia de todas as outras em sua época. Por isso, ela não foi adotada por nenhum movimento.”

Anarquista, Lacerda não deixou de questionar o próprio anarquismo ao perceber que o movimento repudiava o sistema de educação comunista da União Soviética, que ela achava um bom modelo. Sufragista, colocou em xeque o movimento pelo voto feminino porque percebeu que as militantes também exploravam outras mulheres, mais pobres, nos trabalhos domésticos. Feminista, criticou o feminismo do início do século 20, pois entendia que a palavra “feminismo” estava perdendo seu significado de luta e se tornando uma espécie de moda – razão pela qual não poderia aceitar “nem o feminismo de votos, muito menos o feminismo de caridade”, como escreveu em texto de 1928.


Dentro da imprensa operária, escreveu em publicações anarquistas importantes como o jornal A Plebe e a revista Renascença, além de outros jornais independentes e progressistas como O Combate e O Ceará. Nestes textos, Lacerda falava principalmente de pedagogia e educação, mas não deixava de denunciar a opressão sofrida por mulheres e crianças.

“Sou ‘indesejável’, estou com os individualistas livres, os que sonham mais alto, uma sociedade onde haja pão para todas as bocas, onde se aproveitem todas as energias humanas, onde se possa cantar um hino à alegria de viver na expansão de todas as forças interiores, num sentido mais alto – para uma limitação cada vez mais ampla da sociedade sobre o indivíduo”, escreveu na época.

Por suas ideias, foi amplamente criticada principalmente em publicações pró-fascismo, mas também defendida por estudantes de esquerda e até por grandes nomes, como a romancista Rachel de Queiroz. Mesmo após a sua morte, em 1945, Lacerda não entrou para a história oficial, nem tampouco é citada em estudos sobre anarquismo no Brasil, segundo Moreira. E mesmo em outras esferas, como no feminismo, pouco se fala sobre ela. Mesmo assim, para Ferraz, sua importância está marcada.

“Maria Lacerda se destaca pela escrita como forma de fazer política”, afirma. “Sua obra dialoga com seus contemporâneos e com autores clássicos, sua erudição não deixa de ser profundamente engajada nos debates de seu tempo, com uma visão radicalmente libertária que interroga sobre o lugar da mulher na formação de nossas sociedades.”





Seu trabalho foi investigado por anarcofeministas, anarquistas e feministas brasileiras e estrangeiras, com destaque à pesquisa de Miriam Moreira Leite nos anos 1980, a primeira a focar exclusivamente na vida e na obra da anarquista. Seus livros raros hoje em dia estão, aos poucos, sendo reeditados por editoras independentes, contudo, não se pode esquecer que o ato de republicar Maria Lacerda é uma ação que coletivos anarquistas já realizavam desde os anos 1990.




Fontes:

wikipedia.org
resvistacult.uol.com.br
google.com
blogs.unicamp.br
tendasdelivros.org




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