quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Menino de engenho


Vamos falar da obra do escritor paraibano, José Lins do Rego, "O menino de engenho".



A figura do senhor de engenho


"O senhor de engenho era o centro em torno do qual girava toda a vida dos engenhos. O senhor absoluto tanto sobre a família quanto sobre os inúmeros escravos e empregados que trabalhavam em suas enormes propriedades. Toda a rotina da casa-grande era comandada pelo senhor, cuja estabilidade patriarcal estava apoiada no açúcar e no escravo. Sob seu teto viviam os filhos, o capelão, as mulheres, que fundamentariam a colonização, e assim, toda a sociedade brasileira. A figura do Senhor do engenho surgiu já nos primeiros anos de colonização da nação com os portugueses vindos para explorar a nova terra. Figura patriarcal de poder absoluto, dono de latifundios, extremamente rico. Além de admnistrador e coronel, o senhor de engenho ainda ocupou uma importante função no crescimento da população brasileira: a de procriador. Despreocupados com a pureza de raça, eles, desde os primórdios da colonização, geraram inúmeros filhos tanto inicialmente com as índias como com a escravas negras, mais tarde. A função de procriação desgarrada, não se baseava apenas na necessidade de aumentar a população das novas terras, ou puramente satisfazer as necessidades lúbricas, mas primeiramente de multiplicar o número de escravos para sua própria lavoura. Gerando assim uma população de bastardos, moleques, destituídos do direito de família, destinados apenas à escravidão, com raras exceções. O senhores de engenho, mesmo após a abolição da escravatura, continuaram sendo os senhores absolutos, figuras centrais na família, nas suas propriedades e, sobretudo, na política regional e nacional."

(Gilberto Freyre - Casa Grande e Senzala e Menino de engenho - José Lins do Rego)






Escrito sob a perspectiva infantil, a do menino Carlinhos, descreve-se a vida num engenho 17 anos após a abolição da escravatura. A história se passa aproximadamente entre 1905 a 1913 (se partirmos do princípio que ela seja autobiográfica).

Carlinhos com apenas quatro anos acordou em uma manhã com um grande barulho em sua casa, encontrou sua mãe largada sobre o chão coberta de sangue e seu pai como um louco a chorar sobre ela. Ele tentou se aproximar da mãe morta, mas o tumulto de empregados e a chegada dos policiais que fecharam o quarto pondo todos pra fora o impediu. Um dos empregados comentou que havia visto o senhor com uma arma na mão e a senhora no chão.
   


Capítulo I

"Eu tinha uns quatro anos no dia em que minha mãe morreu. Dormia no meu quarto, quando pela manhã me acordei com um enorme barulho na casa toda. Eram gritos e gente correndo para todos os cantos. O quarto de dormir de meu pai estava cheio de pessoas que eu não conhecia. Corri para lá, e vi minha mãe estendida no chão e meu pai caído em cima dela como um louco. A gente toda que estava ali olhava para o quadro como se estivesse em um espetáculo. Vi então que minha mãe estava toda banhada em sangue, e corri para beijá-la, quando me pegaram pelo braço com força. Chorei, fiz o possível para livrar-me. Mas não me deixaram fazer nada. Um homem que chegou com uns soldados mandou então que todos saíssem, que só podia ficar ali a polícia e mais ninguém." (p.25)




O pai de Carlinhos vivia entre transtornos e a mãe dele sofria com as grandes explosões do marido. Porém logo ele, entre lágrimas, se arrependia e era perdoado. A mãe, Clarisse era doce, meiga, um anjo. Depois de tal catástrofe o pai de Carlinhos foi levado preso e em um abraço doloroso se despediu do filho. Após alguns dias ele foi levado para a fazenda do avô.



A análise de Freyre compreende toda a época da escravatura. No entanto, como veremos, a vida do engenho do menino Carlinhos não se diferenciava muito da vida durante a escravatura. A seguinte análise se baseia nos temas principais que ocorrem tanto no “Menino de Engenho” quanto em “Casa Grande & Senzala”, ocorrências que se completam e se esclarecem mutuamente. A parte principal compreende os três primeiros quadros, que tratam do senhor de engenho, da mulher no engenho e dos meninos. Além disso se analisa também fatores como a higiene e a religiosidade nos engenhos. Ambas as perspectivas, do sociólogo e do escritor, concorrem para o melhor esclarecimento dos diferente quadros
O livro se inicia com Carlos ainda criança, com apenas quatro anos, e relata a vida de Carlos ao lado dos pais. Os três primeiros capítulos falam da passagem da vida de criança para a vida de adolescente, retratando o drama vivido pelo menino cujo pai matou a mãe na sua frente e acabou indo para um hospício. Esta tragédia muda radicalmente a vida de Carlos.



Nos capítulos seguintes será narrada a vida de Carlos no Engenho. Seu Tio Juca o leva da cidade para o campo e a partir de então o menino viverá no Engenho o avô materno. O menino vai crescendo e os episódios de sua infância e adolescência vão sendo retratados na história, mesmo que de forma rápida. O ambiente rural é muito bem retratado, ressaltando-se os moleques com quem ele brincava, os passeios de trem, os banhos de rio, as idas à escola, os conflitos com sua tia megera, etc.

"Tio Juca me levou para tomar banho no rio. Com uma toalha no pescoço e um copo grande na mão, chamou-me para o banho. — Você precisa ficar matuto. Descemos uma ladeira para o Paraíba, que corria num pequeno fio d’água pelo areal branco e extenso. — Vamos para o Poço das Pedras. Pouco mais adiante, debaixo de um marizeiro, de copa arrastando no chão, lá estava uma destas piscinas que o curso e a correnteza do rio cavavam nas suas margens. E foi aí, com meu tio Juca, que bebeu, antes de seu banho, um copo cheio de remédio para o sangue, dormido no sereno, que entrei em relação íntima com o engenho de meu avô. A água fria de poço, naquela hora, deixou-me o corpo tremendo. Meu tio então começou a me sacudir para o fundo, me ensinando a nadar. " (p.32)


Os personagens desta história são a Tia Maria que, acaba substituindo a mãe de Carlos em sua memória; o Tio Juca que leva Carlos da cidade para o engenho e lhe apresenta o avô; a Tia Sinhazinha, uma velha que dirigia o engenho em plenos sessenta anos de idade, e que foi casada com um dos mais ricos homens daquela região, mas acabou se separando ainda no início do casamento. Tia Sinhazinha se destaca na história como a tirana que atormenta a vida de Carlos, bem como dos escravos, dos outros moleques e dos demais subordinados que tinham que se submeter à sua tirania. Além destes, aparecem com menor destaque o avô José Paulino, a prima Lili e o moleque Ricardo.




Capítulo XII

''A velha Sinhazinha não gostava de ninguém. Tinha umas preferências temporárias por certas pessoas a quem passava a fazer gentilezas com presentes e generosidades. Isto somente para fazer raiva aos outros. Depois mudava. E vivia assim, de uns para outros, sem que ninguém gostasse dela e sem gostar direito de ninguém. De mim nunca se aproximou. E eu mesmo fugia, sempre que podia, de sua proximidade. Mas a propósito de nada, lá vinha com beliscões e cocorotes. Trancava na despensa as frutas, andava com a chave do guarda-comidas no cós da saia, para contrariar as nossas gulodices e fazer raiva à gente grande da casa. A tia Maria roubava para a gente os sapotis e as mangas que a velha deixava em montão apodrecer. O meu ódio a ela crescia dia a dia." (p.43)

A história é narrada em primeira pessoa pelo próprio Carlos (narrador-personagem), que vai deixando suas impressões a respeito dos ambientes em que viveu, com um certo tom de criticidade, mostrando a triste e decadente realidade que o personagem presencia.


Capítulo XL

"No dia seguinte tomaria o trem para o colégio. O meu tio Juca me levaria para os padres, deixando carta branca a meu respeito. Acordei com os pássaros cantando no gameleiro. Tocavam dobrados ao meu bota-fora. E uma saudade antecipada do engenho me pegou em cima da cama. Vieram-me acordar. Há tempo que estava de olhos abertos na companhia de meus pensamentos. Uma outra vida ia começar para mim. — Colégio amansa menino! "


Tendo sido publicado em 1932, o livro é a estreia do autor, José Lins do Rego, como romancista, e também o primeiro romance do ciclo da cana-de-açúcar.



A obra foi levada ao cinema em 1965, com direção de Walter Lima Jr., com Antonio Pitanga, Maria Lucia Dahl, Geraldo Del Rey e Maria da Conceição.



Fontes:

infoescola.com
academia.edu/o menino de engenho
Menino do Engenho-Rego, José Lins/Gilberto Freyre
brasilescola.uol.com.br
google.com
wikipedia.org
edisciplinas.usp.br

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