segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

 A queda da casa de Usher - Edgar Allan Poe



"Son couer est un luth suspendu;Sitôt qu'on le touche, il résonne". 

Seu coração é um alaúde silencioso, assim que tocamos nele ele ressoa

Du Beranger


 Durante todo um dia pesado, escuro e mudo de outono, em que nuvens baixas amontoavam-se opressivamente no céu, eu percorri a cavalo um trecho de campo singularmente triste, e finalmente me encontrei, quando as sombras da noite se avizinhavam, à vista da melancólica Casa de Usher. Não sei como foi – mas, ao primeiro olhar que lancei ao edifício, uma sensação de insuportável angústia invadiu o meu espírito. Digo insuportável, pois tal sensação não foi aliviada por nada desse sentimento quase agradável na sua poesia, com o qual a mente ordinariamente acolhe mesmo as imagens mais cruéis por sua desolação e seu horror. Olhei para a cena que se abria diante de mim – para a casa simples e para a simples paisagem do domínio para as paredes frias – para as janelas paradas como olhos vidrados – para algumas moitas de juncos – e para uns troncos alvacentos de árvores mortas – com uma enorme depressão mental que só posso comparar, com alguma propriedade, com os momentos que se sucedem ao despertar de um fumador de ópio – com o momento amargo de retorno à rotina – com o terrível cair do véu. Eu tinha no coração uma invencível tristeza onde nenhum estímulo da Imaginação podia descobrir qualquer coisa de sublime. Que era – pensava eu, imóvel – que era isso que tanto me atormentava na contemplação da Casa de Usher ?

(p.7)


O conto faz parte da obra "Histórias extraordinárias", de Edgar Allan Poe, escritor norte-americano, nascido em Boston em 19 de janeiro de 1809. Morreu em Baltimore em 7 de outubro de 1849.


Sua obra tinha como característica o mistério e o terror, como sua obra "O corvo", já comentado nesse blog.


Edgar Allan Poe



O conto a queda da casa de Usher foi transformada em minissérie pela Netflix. 


A queda da casa de Usher - trailer



O conto é narrado por um personagem sem nome, que vai passar alguns dias na mansão de Roderick, seu antigo amigo de infância. Roderick e sua irmã gêmea, Madeline, são os únicos herdeiros da tradicional e misteriosa família Usher.

Ao chegar na casa, o narrador se surpreende com o ambiente assustador onde seu amigo vive. A famosa Casa de Usher parece estar envolvida por uma atmosfera opressiva, que causa calafrios em seu visitante. O estado de saúde dos irmãos também é preocupante: Lady Madeline está à beira da morte, enquanto Roderick diz estar sofrendo de uma doença hereditária, que faz com que seus sentidos fiquem aguçados no limite do suportável.

Com o passar dos dias, o narrador descobre que o destino da mansão e de seus moradores está interligado de uma forma irremediável (de fato, a “Casa de Usher” do título pode se referir tanto à moradia da família, quanto à família propriamente dita).

A mansão parecia sombria e tinha uma rachadura em ziguezague que corria do telhado até quase o lago.
Roderik estava com medo da mansão.
A irmã semelhante de Roderik, Lady Madeline, morrera alguns dias atrás.

Confessou, entretanto, ainda que com hesitação, que grande parte da angústia que assim o atormentava podia ser atribuída a uma origem mais natural e muito mais palpável – à enfermidade longa e implacável – em verdade ao aniquilamento evidentemente próximo – de uma irmã ternamente amada, sua única companheira através de longos anos, seu único e último parente na terra. — "A morte dela" — disse-me com uma amargura de que nunca posso esquecer-me — "fá-lo-ia (a ele, tão desesperado e fraco) o último sobrevivente da velha estirpe dos Usher." Enquanto falava, a Senhora Madeline (pois assim era ela chamada) passou através de uma parte remota do aposento e, sem ter notado a minha presença, desapareceu. Olhei-a com um grande espanto não isento de receio; e, todavia, achei impossível explicar semelhante impressão. Uma sensação de estupor me oprimia enquanto o meu olhar seguia os seus passos de retirada. Quando uma porta, finalmente, se fechou atrás dela, o meu olhar procurou instintivamente e avidamente 10 10 a fisionomia do seu irmão; mas ele escondera o rosto entre as mãos, e só pude perceber que uma palidez mais profunda do que a ordinária se espalhara pelos seus dedos emaciados, dos quais gotejavam lágrimas ardentes. O mal da Senhora Madeline desafiara por muito tempo a habilidade dos médicos. Uma apatia estabilizada, uma lenta e gradual destruição física, e, frequentes embora rápidas afecções de aspecto parcialmente cataléptico, eram o diagnóstico habitual. Até então, ela lutara firmemente contra as investidas do mal, e não se resolvera ainda a entregar-se à cama; mas, ao cair da noite do dia de minha chegada à casa, submeteu-se (conforme seu irmão me relatou mais tarde numa indizível agitação) à força deprimente da enfermidade implacável; e compreendi que o olhar que eu obtivera de sua pessoa seria provavelmente o último que obteria dela – que aquela dama, pelo menos enquanto vivesse, nunca mais seria vista por mim. (p.9 e 10)




A mulher morta foi levada para uma cripta familiar por Roderik e o protagonista.

Uma noite, Roderik estremeceu pela companhia de um amigo que leu um livro para ele.

Enquanto o protagonista contava a história do jovem Ethelred, os sons do romance estavam de acordo com os sons da mansão. Ethelred é um personagem do livro "Mad Trist" de Sir Launcelot Canning.

A porta da sala onde os velhos amigos foram encontrados se abre e eles ficam chocados ao ver Madeline em pé na frente deles.


"De repente, surgiu ao longo do caminho uma luz estranha, e eu me voltei para ver donde poderia ter saído uma claridade tão insólita, pois atrás de mim só havia a mansão com suas sombras. O resplendor vinha de uma lua no ocaso grande e cor de sangue, que agora brilhava vivamente através daquela fenda antes apenas perceptível, da qual eu disse que se estendia desde o telhado do edifício, fazendo ziguezague, até ao alicerce. Enquanto eu olhava, esta fenda rapidamente se alargou – houve uma rajada mais impetuosa da ventania – o globo inteiro do satélite invadiu de repente o campo de minha visão – meu cérebro sofreu um como desfalecimento  quando vi que as grossas paredes ruíam, despedaçando-se – houve um longo e tumultuoso estrondo, com mil vozes de água – e a profunda e sombria lagoa aos meus pés fechou-se funebremente por sobre os destroços da "Casa de Usher". 
(p.22)


Roderick e Madeline Usher são estereótipos de figuras românticas. Ela é como tantas outras “mocinhas” do Romantismo: jovem, misteriosa, pálida e com a saúde debilitada. Já Roderick personifica o próprio artista romântico, atormentado e sensível, que pinta quadros, toca instrumentos e escreve poesia. Um de seus poemas, Solar dos espectros, aparece em A queda da casa de Usher – é sobre um castelo que é invadido e conquistado por “entes do mal”.

O conto narra a história da família Usher que é acometida de uma doença que os leva à depressão e a tristeza, pouco a pouco se desapegando da vida, retratada pela deterioração da mansão dos Usher.


Fontes:

wikipedia.org
liualcarothar.files.wordpress.com
desejoliterario.com
valeugutenberg.com
www.ebiografia.com
youtube.com
google.com

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