Era este reitor um padre velho e dado, que há muito conseguira na paróquia transformar em amigos todos os fregueses. Tinha o Evangelho no coração - o que vale muito mais ainda do que tê-lo na cabeça. A qualidade de egresso não tolhia os ser liberal de convicção. Era-o como poucos. — Ó homem de Deus - disse pois o reitor um dia, resolvido deveras a sondar as profundezas daquele mistério - que tens tu há tempos a esta parte? Que empresa é essa em que me andas a cismar há tantos dias? — Que quer, Sr. Padre Antônio? um homem de família tem sempre em que cuidar; tem a sua vida e tem a dos filhos. Foi a resposta que obteve. — Ora essa! - insistiu o padre - Bem alegre te via eu, em tempos mais azados para tristezas, e bem alegres vejo muitos com bem outras razões para o contrário. Mas tu! Que mais queres? Tens bons haveres para deixares a teus filhos.; mas, quando não os tivesses, sempre eram dois rapazes; e deixa lá, José; um homem é outra coisa que não é uma mulher; onde quer se arranja; toda a terra é sua; em toda a parte encontra o que fazer, e qualquer trabalho lhe está bem. Agora os pobres que vejo por ai com um rancho de raparigas, coitadinhas, que ficam mesmo ao desamparo de todo, se a sorte lhes roubar o pai... esses, sim, é que não sei como podem ter um momento de alegria; e contudo encontrá-los nas festas, que é um louvar a Deus. — É assim, Sr. Reitor, eu sei que os há por aí mais infelizes do que eu, mas... — Mas então, quem tem saúde e a quem Deus não falta com o pão nosso cotidiano, só deve erguer as mãos ao céu para lhe tecer louvores. Mareia a tua vida, que teus filhos não são nenhuns aleijados para precisarem pedir esmolas.
As pupilas do senhor reitor - Cap. I - p.3
As "pupilas do senhor reitor" é um romance do escritor português Julio Diniz lançado em 1866 como folhetim e editado como livro em 1867.
Conta a história de dois irmãos, Daniel e Pedro filho do agricultor José das Domas. Pedro o mais velho se assemelhava muito com o pai, inclusive no trato com a terra. Já Daniel não gostava do serviço do campo e foi enviado pelo pai para a cidade do Porto onde se formou médico homeopata.
Dez anos mais tarde, Daniel retorna ao vilarejo de seu pai e reencontra Margarida, sua paixão de infância, e descobre que seu irmão Pedro está noivo da irmã dela, Clara.
Daniel encanta-se com a futura cunhada e tenta seduzi-la. A princípio Clara incentiva o rapaz ,mas depois vendo a gravidade da situação concede um encontro no jardim para dissuadi-lo da aventura.
No entanto, eles são surpreendidos por Pedro, e são salvos por Margarida que assume o lugar da irmã, dizendo ser ela que se encontrou sozinha com Daniel, prejudicando a sua própria reputação.
Daniel fica impressionado com a abnegação de Guida, e se lembra da antiga paixão pueril.
No final Pedro se casa com Clara e Daniel com Margarida.
O romance possui todos os elementos do Romantismo, como paixões impossíveis, exagero sentimental, excesso de adjetivação, uso intenso de reticências, exclamações e interrogações, e geralmente um final onde o Amor prevalece.
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