segunda-feira, 6 de outubro de 2025







primeira parte

 ANTARES 


Afirmam os entendidos que os ossos fósseis recentemente encontrados numa escavação feita em terras do município de Antares, na fronteira do Brasil com a Argentina, pertenciam a um gliptodonte, animal antediluviano, que, segundo as reconstituições gráficas da Paleontologia, era uma espécie de tatu gigante dotado duma carapaça inteiriça e fixa, mais ou menos do tamanho dum Volkswagen, afora o formidável rabo à feição de tacape ricado de espigões pontiagudos. Calcula-se que durante o Pleistoceno, isto é, há cerca de um milhão de anos, não só gliptodontes como também megatérios habitavam essa região diabásica da América do Sul, onde – só Deus sabe ao certo quando – veio a formar-se o rio hoje conhecido pelo nome de Uruguai. Ignora-se, todavia, em que época da Era Cenozóica surgiram naquela zona do Brasil meridional os primeiros espécimes do Homo sapiens. Tudo nos leva a crer, entretanto, que esse problema jamais tenha preocupado os antarenses. O que até hoje ainda os deixa ocasionalmente irritados é o fato de car-tógrafos, não só estrangeiros como também nacionais, n|o mencionarem nunca em seus mapas a cidade de Antares, como se São Borja fosse a única localidade digna de nota naquelas paragens do Alto Uruguai. De pouco ou nada têm servido os memoriais assinados pelo Prefeito Municipal, pelos membros da Câmara de Vereadores e por outras pessoas gradas e repetidamente dirigidos ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, contra a acintosa omissão. O Pe. Albuquerque, quando ainda vigário da Matriz local, mais de uma vez encaminhou, mas em vão, idêntica reclamação ao Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul, do qual era membro correspondente. No entanto a verdade clara e pura é que, a despeito da má vontade ou da ignorância dos fazedores de cartas geográficas, a cidade de Antares, sede do município do mesmo nome, lá está, visível e concreta, à margem esquerda do grande rio. protestando Gerôncio O incidente que se vai narrar, e de que Antares foi teatro na sexta-feira 13 de dezembro do ano de 1963, tornou essa localidade conhecida e de certo modo famosa da noite para o dia – fama um tanto ambígua e efêmera, é verdade – não só no Estado do Rio Grande do Sul como também no resto do Brasil e mesmo através de todo o mundo civilizado. Entretanto, esse fato, ao que parece, não sensibilizou até agora geógrafos e cartógrafos.

Assim começa o último romance de Érico Veríssimo, Incidente em Antares.


"Incidente em Antares" de Érico Veríssimo é um romance satírico que se passa numa cidade fictícia chamada Antares, onde, após uma greve de coveiros, sete mortos "ressuscitam" para exigir um sepultamento digno e, como fantasmas, expõem os segredos e a corrupção dos vivos. A obra, lançada em 1971, durante a ditadura militar brasileira, usa o realismo fantástico para criticar o autoritarismo, a repressão e a hipocrisia social da época, dando aos defuntos, com a impunidade da morte, o poder de denunciar arbitrariedades e clamar por justiça.

A greve e os defuntos: Em 1963, após uma greve de coveiros, sete pessoas morrem na fictícia cidade de Antares, e seus corpos não podem ser sepultados.O despertar: Os mortos, em vez de ficarem nos caixões, levantam-se para exigir um enterro digno e, como fantasmas, passam a vagar pela cidade.A exposição dos segredos: Em sua condição de defuntos, eles podem vasculhar a intimidade dos vivos sem medo de represálias, descobrindo e revelando segredos, crimes e injustiças cometidas pela elite local e pelos governantes corruptos. Crítica social:   

A obra é uma alegoria da sociedade brasileira durante a ditadura militar, utilizando os fantasmas para denunciar a violência, a repressão e a falta de liberdade de expressão que marcavam o período.

Contexto e Crítica:

Realismo Fantástico: Veríssimo utiliza elementos fantásticos para dar voz às queixas e denúncias que não podiam ser feitas abertamente devido à censura da ditadura.


Erico Verissimo





Sátira Política: 

O romance é uma sátira social e política que, através do humor, critica o autoritarismo, a corrupção e a hipocrisia do regime militar e da sociedade da época.
O poder dos "mortos": A condição de "mortos" confere aos personagens a impunidade necessária para expor a verdade e denunciar as arbitrariedades sofridas pelo povo brasileiro, como a tortura de presos políticos.




A história, dividida em duas partes (Antares e o Incidente), gira em torno de uma pequena cidade no interior do Rio Grande do Sul que tem a sua rotina completamente virada de cabeça para baixo após uma greve geral.

Operários, garçons, bancários, enfermeiros, funcionários do cemitério... todos aderiram a greve e a cidade parou. Diante da impossibilidade de serem enterrados os sete cadáveres que faleceram durante aquele período, os defuntos se levantam dos seus caixões e passam a perambular pela cidade.

Publicado no auge da ditadura militar, Incidente em Antares é uma história ao mesmo tempo cômica e dramática que promove uma crítica à política brasileira.

Resumo

Primeira parte: Antares

Na primeira parte do romance de Érico Veríssimo ficamos conhecendo a pequena cidade fictícia de Antares, situada no Rio Grande do Sul, quase na fronteira com a Argentina.

A região era dominada por duas famílias que se odiavam profundamente: os Vacariano e os Campolargo. A descrição da cidade e do mecanismo de funcionamento social ocupa quase um terço do texto. Fica claro ao longo da leitura das páginas como as duas famílias que geriam a região tinham valores altamente questionáveis e se alfinetavam mutuamente.

Antares dá conta da genealogia da terra (os primeiros estrangeiros que lá estiveram) e também da genealogia das duas famílias mais importantes da região. O domínio do local começou com Francisco Vacariano, que durante mais de dez anos foi "autoridade suprema e inconteste na vila".

O conflito teve início quando Anacleto Campolargo, no verão de 1860, demonstrou interesse em comprar terras na região. Francisco Vacariano logo deixou claro que não queria intrusos na sua região.

Por fim, afrontando Francisco, Anacleto adquiriu as terras vizinhas fomentando o ódio que duraria gerações:


A primeira vez em que Chico Vacariano e Anacleto Campolargo se defrontaram nessa praça, os homens que por ali se encontravam tiveram a impressão de que os dois estancieiros iam bater-se num duelo mortal. Foi um momento de trepidante expectativa. Os dois homens estacaram de repente, frente a frente, olharam-se, mediram-se da cabeça aos pés, e foi ódio à primeira vista. Chegaram ambos a levar a mão à cintura, como para arrancar as adagas. Nesse exato momento o vigário surgiu à porta da igreja, exclamando: “Não! Pelo amor de Deus! Não!”

Anacleto Campolargo foi se fixando na vila, erguendo a sua casa, fazendo amigos e fundando o Partido Conservador.

Chico Vacariano, para demonstrar logo a sua oposição, fundou o Partido Liberal. E assim, de pequenas em pequenas disputas, foi se constituindo a péssima relação entre as duas famílias.

Deixando de lado o conflito entre as duas dinastias influentes, Antares de não pequena quase não se percebia no mapa. Apesar de lá terem sido encontrados encontrados ossos fósseis da época dos dinossauros (os ossos seriam de um gliptodonte), a cidade permaneceu no anonimato, sendo mais lembrada a sua vizinha, São Borja.

Segunda parte: O incidente



segunda parte

O INCIDENTE 


Pouco depois da meia-noite, naquela quarta-feira, 11 de dezembro de 1963, Tibério Vacariano entrou no centro telefônico de Antares para tentar comunicar-se diretamente com o Palácio do Governo, em Porto Alegre. – Tem defeito na linha, coronel – informou-lhe a operadora. – Eu espero. Não saio daqui sem falar com o governador. Mandou buscar em casa cuia, bomba, erva, chaleira, fogareiro – aboletou-se na melhor cadeira da agência, preparou um mate e ali ficou, a chimarrear e a fumar palheiros, durante horas e horas, resmungando coisas para si mesmo e de vez em quando esporeando a moça com frases assim: “Continue tentando”. – “Esse negócio sai ou não sai?” _ «Não durma!” O tempo passava. A operadora cabeceava de sono. A intervalos quase reguläres o coronel ia até ao fundo da casa pata esvaziar a bexiga, deixando na parede traseira do prédio efêmeras pinturas murais. Às três da madrugada j&andou buscar em casa um café preto e forte, para ajudá-10 a vencer a própria sonolência. Pouco após o raiar do dia a operadora teve um estremecimento. – Porto Alegre está atendendo! – exclamou. – Alô! Aqui é Antares. Tenho um chamado urgente para o Palácio do Governo. Alô? Eu sei que são cinco da manhã, mas tente a ligação, pelo amor de Deus! Tibério Vacariano, que cabeceava de sono, ficou de repente desperto e ergueu-se lépido. A telefonista voltou para ele um olhar turvo, emoldurado por pálpebras intumescidas. – O Palácio está respondendo – disse com a voz era-pastada de sono. – Pegue aquele telefone, coronel. .. Tibério agarrou sofregamente o fone do aparelho indicado, levou-o ao ouvido e gritou: – Alô! Palácio do Governo? Hem? Não estou ouvindo nada... Alô? Aqui é o Cel. Tibério Vacariano. Preciso falar com a maior urgência com o governador... 

O incidente, que dá nome à segunda parte do livro, aconteceu sexta-feira, dia 13 de dezembro do ano de 1963 e colocou Antares no radar do Rio Grande do Sul e do Brasil. Embora a fama tenha sido passageira, foi graças ao incidente que todos ficaram conhecendo essa pequena cidade ao sul do país.

Por incrível coincidência, cinco anos depois, numa sexta-feira, 13 de dezembro de 1968, foi decretado o famigerado AI-5.

No dia 12 de dezembro de 1963, ao meio-dia, foi declarada uma greve geral em Antares. A greve abrangia todos os setores da sociedade: indústria, transportes, comércio, central elétrica, serviços.

A greve começou com os trabalhadores das fábricas, que saíram para o almoço e não retornaram para o trabalho.

Depois foi a vez dos funcionários dos bancos, dos restaurantes e até da companhia de energia elétrica abandonarem os respectivos postos. Os funcionários da empresa que fornecia a luz cortaram a luz da cidade inteira, só pouparam os cabos que forneciam energia aos dois hospitais da região.

Os coveiros e o zelador do cemitério também aderiram a greve de Antares, causando assim um enorme problema na região.

O cemitério havia sido igualmente interditado pelos grevistas, mais de quatrocentos operários que fizeram um cordão humano para impedir a entrada no local.


“Mas que pretendem eles com essa atitude tão antipática?” – perguntava-se. A resposta era, quase invariavelmente: “Fazer pressão sobre os- patrões para conseguir o que querem”.

Durante a greve morreram sete cidadãos antarenses que, com o protesto, não puderam ser devidamente enterrados. Os defuntos eram: Prof. Menandro (que suicidou-se cortando as veias dos pulsos);
D. Quitéria Campolargo (a matriarca da família Campolargo que morreu de enfarto do miocárdio);
Joãozinho Paz (político, faleceu no hospital, com embolia pulmonar);
Dr. Cícero Branco (advogado das duas famílias poderosas, foi vítima de um derrame cerebral fulminante);
Barcelona (sapateiro comunista, não se sabe a causa da morte);
Erotildes (uma prostituta que morreu tísica);
Pudim de Cachaça (o maior beberrão de Antares, foi assassinado pela própria mulher, a Natalina).

Impossibilitados de serem enterrados diante da greve, os sete caixões ficam à espera com os seus corpos dentro. Os mortos, então, se levantam e seguem em direção à cidade.

Como já estão mortos, os corpos podem entrar em todos os lugares e descobrir detalhes da condição em que morreram e da reação das pessoas com o recebimento da notícia do falecimento.

Os mortos se separam e cada um segue em direção à sua casa para reencontrar os parentes e amigos. Para não se perderem uns dos outros, eles marcam um encontro para o dia seguinte, ao meio dia, no coreto da praça.

Ao meio dia lá se encontram os sete mortos que, sob os olhares da população, começam a fazer denúncias contra alguns dos vivos sem temer qualquer tipo de represália. Afirma Barcelona:




Sou um defunto legítimo e portanto estou livre da sociedade capitalista e dos seus lacaios.

O político Joãozinho Paz, por exemplo, denuncia o enriquecimento ilícito dos poderosos da região e deixa transparecer a situação da sua morte (ele fora torturado pela polícia).

A prostituta Erotildes também aproveita a ocasião e aponta alguns dos seus clientes no meio da multidão. Barcelona, que era sapateiro e ouvia muitos dos casos na sua sapataria, também acusa os adúlteros da cidade.

Diante do caos provocado pelas denúncias, os grevistas resolvem atacar os mortos que estavam no coreto. Os defuntos, por fim, conseguem seguir para o cemitério e são enterrados como era suposto.

A história dos mortos-vivos ganha fama e Antares se enche de repórteres que querem escrever notícias sobre o assunto, mas nada consegue ser provado.

As autoridades locais, para acobertarem o caso, dizem que a história foi inventada para promover uma feira de agropecuária que aconteceria na região.


Os mortos na minissérie
Diogo Vilela, Elia Gleizer, Paulo Betti, Fernanda Montenegro, Rui Resende, Marília Pera e Gianfrancesco Guarniere









O romance foi levado à TV na minissérie do mesmo nome.  Em 1994, a Rede Globo apresentou a minissérie Incidente em Antares, adaptada por Charles Peixoto e Nelson Nadotti, e baseada no romance de Érico Veríssimo. A minissérie teve a direção de José Roberto Sanseveriano e contou com os atores Regina Duarte, Fernanda Montenegro e Paulo Betti no elenco, entre outros.



Fontes:

wikipédia.org
aulasdathaisunitau.com
www.culturagenial.com
google.com

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