Vamos falar de um dos episódios mais marcantes da Literatura Portuguesa, a Questão Coimbrã; especialmente da resposta do escritor da corrente realista Antero de Quental ao escritor conservador da corrente do Modernismo Antonio Feliciano de Castilho.
A Questão Coimbrã, também chamada de Questão do Bom Senso e Bom Gosto, foi uma discussão travada em 1865, pelo famoso escritor romântico português Antonio Feliciano de Castilho, cego aos seis anos, vitima de sarampo, foi um dos maiores escritores e intelectuais portugueses do século XIX, autor de "O presbítero da Montanha" 1844; "Os ciúmes do Bardo" - 1844; "A chave do enigma" - 1861, e por outro lado por estudantes da famosa Universidade de Coimbra, principalmente por Antero de Quental, Teófilo Braga e Vieira de Castro, que deram início ao Realismo Português, que propunha romper com a estética literária do Romantismo, falando de forma mais crua e menos romântica da realidade portuguesa.
Famosa foi a carta de Antero de Quental para Castilho, intitulada "Bom senso e Bom Gosto", rebatendo as críticas deste para os acadêmicos de Coimbra, de 2 de novembro de 1865.
Num dos trechos Antero diz:
"Porque é uma acção deshonesta . O que se ataca na eschola de Coimbra (talvez mesmo v. ex.a o ignore, por que ha malevolos innocentes e inconscientes), o que se ata ca não é uma opinião litteraria menos provada, uma con cepção poetica mais atrevida, um estylo ou uma idea. Isso é o pretexto, apenas. Mas a guerra faz-se á independen cia irreverente de escriptores, que entendem fazer por si o seu caminho, sem pedirem licença aos mestres, mas con sultando só o seu trabalho e a sua consciencia. A guerra faz -se ao escandalo inaudito d’uma litteratura desaforada, que cuidou poder correr mundo sem o sello e o visto da chancellaria dos grãos- mestres officiaes . A guerra faz- se á impiedade d'estes hereges das lettras , que se revoltam contra a auctoridade dos papas e pontifices, porque, ao que parece, ainda a luz de cima Thes não escreveu nas frontes o signal da infallibilidade. Faz -se contra quem en tende pensar por si e ser só responsavel por seus actos e palavras... Agora quem move estes ridiculos combates de phrases é a vaidade ferida dos mestres e dos pontifices ; é o espirito de rotina violentamente incommodado por mãos rudes e in convenientes; é a banalidade que quer dormir socegada no seu leito de ninharias; é a vulgaridade que cuida que a forçam – nós só lhe queremos puchar as orelhas ! Isto, resumido em poucas palavras, quer dizer : comba tem -se os hereges da eschola de Coimbra por causa do negro crime de sua dignidade, do atrevimento de sua re ctidão moral, do attentado de sua probidade litteraria, da impudencia e miseria de serem independentes e pensarem 6 . por suas cabeças. E combatem -se por faltarem ás virtu des de respeito humilde ás vaidades omnipotentes, de sub missão estupida, de baixeza e pequenez moral e intelle ctual"
Em outro trecho ele diz:
"Os outros adoram a palavra, que illude o vulgo, e des prezam a idea , que custa muito e nada luz . São apostolos do diccionario, e têm por evangelho um tractado de me trificação. Fazem da poesia o instrumento de suas vaida des . Pregam o bem por uso e convenção litteraria , por que se presta á declamação poetica, mas practicam o egoismo por indole e por vontade. Fazem -nos descrer da grandeza humana, porque são uns sophismas que nos mostram a pe quenez e a má fé aonde as apparencias são todas de no breza. Preferem imitar a inventar; e a imitar preferem ainda traduzir. Repetem o que está dicto ha mil annos, e 0 fazem -nos duvidar se o espirito humano será uma esteril e constante banalidade . São os enfeitadores das ninharias lu zidias. Põem os nadas em pé para parecerem alguma cousa. São os idolos litterarios da multidão que mal sabe ler . São os philosophos queridos da turba quenunca pensou. São, emfim , genios no Brasil como v. ex."
Essa carta foi uma resposta à carta posfácio de Castilho sobre um poema de Pinheiro Chagas, chamado "Poema da Mocidade".
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