No dia 23 de setembro de 1973 morria em Santiago, no Chile, doze dias após o famigerado golpe de Estado que matou o presidente Salvador Allende. Neftalí Ricardo Eliecer Reyes Basoalto, mais conhecido como Pablo Neruda, poeta, senador chileno, membro do comitê central do Partido Comunista, embaixador do país na França e vencedor do Prêmio Nobel de Literatura de 1971. Nascido no dia 12 de julho de 1904, na cidade chilena de Parral, Neruda teve a sua obra editada em vários países e serviu como referência artística para muitos novos talentos do século XX. Em 1945, mesmo ano em que foi eleito senador no Chile, ele veio ao Brasil e leu o poema "Mensagem" para mais de 100 mil pessoas no Estádio do Pacaembu, em São Paulo, em homenagem ao líder comunista Luís Carlos Prestes.
"Em todas as épocas a poesia foi dada como morta, ela porém se tem mostrado centrífuga e sempiterna, se tem mostrado vitalícia, ressuscita com grande intensidade, parece ser eterna. Com Dante pareceu que terminava. Porém pouco depois Jorge Marinque lançava uma centelha, espécie de sputinik, que prosseguia cintilando nas trevas. E logo Victor Hugo parecia arrasar, não ficava nada para os demais. Então o senhor Charles Baudelaire apresentou-se corretamente trajado de dândi, seguido do jovem Arthur Rimbaud, trajado de vagabundo, e a poesia começou de novo. Depois de Walt Whitman, que esperança!, já ficaram plantadas todas as folhas de relva, não se podia pisar no relvado. Não obstante, veio Maiakovski e a poesia parecia uma casa de máquinas: deram-se assobios, disparos, suspiros, soluços, ruídos de trens e de carros blindados. E assim prossegue a história.
É claro que os inimigos da poesia sempre pretenderam assestar-lhe uma pedrada num olho ou um golpe de garrote na nuca. Fizeram-no de diversos modos, como marechais individuais, inimigos da luz, ou regimentos burocráticos que marcharam com passo de ganso contra os poetas. Conseguiram a desesperação de alguns, a decepção de outros, as tristes retificações dos menos. Mas a poesia começou a brotar como uma fonte ou manar como uma ferida, ou a construir com o braço partido, ou a cantar no deserto, ou a levantar-se como uma árvore, ou a transbordar como um rio, ou a estrelar-se como a noite nas mesetas da Bolívia.
A poesia acompanhou os agonizantes e estancou as dores, conduziu às vitórias, acompanhou os solitários, foi queimante como o fogo, leve e fresca como a neve, teve mãos, dedos e punhos, teve brotos como a primavera, teve olhos como a cidade de Granada, foi mais veloz do que os projéteis dirigidos, foi mais forte pelas fortalezas: deitou raízes no coração do homem.
[...] A poesia tem comunicação secreta com os sofrimentos do homem. Há que ouvir os poetas. É uma lição de história."
- Pablo Neruda, em "Respondendo a uma pesquisa", no livro “Para nascer nasci”. [tradução Rolando Roque da Silva]. Rio de Janeiro: DIFEL, 1981. - Texto extraído 'Releituras'
HÉLIOS - HELIOS
INICIAL
TENHO ANDADO sob Hélios, sangrento mirante,
trabalhando em silêncio meus jardins ausentes.
A minha voz será a do semeador que cante
quando lança nos sulcos ardente semente.
E fecho, fecho os lábios, e em rosas trementes
desata-se a voz, como a água na fonte.
Que se não têm a pompa, e se não são fragrantes,
são as primeiras rosas - irmão caminhante -
do desconsolo, o meu jardim adolescente.
INICIAL
HE IDO bajo Helios, que me mira sangrante
laborando en silencio mis jardines ausentes.
Mi voz será la misma del sembrador que cante
cuando bote a los surcos siembras de pulpa ardiente.
Cierro, cierro los labios, pero en rosas, tremantes
se desata mi voz, como el agua en la fuente.
Que si no son pomposas, que si no son ,
son las primeras rosas —hermano caminante—
de mi desconsolado jardín adolescente.
- Pablo Neruda, em "Crepusculário". [tradução José Eduardo Degrazia]. Edição Bilíngue. Porto Alegre: L&PM, 2011.
§
VELHO CEGO, CHORAVAS
VELHO CEGO, choravas quando a tua vida
era boa, quando possuías nos teus olhos o sol:
mas se o silêncio já chegou, o que é que esperas,
o que é que esperas, cego, desta maior dor?
Em teu rincão pareces menino nascido
sem pés para a terra e sem olhos de mar
e como os animais dentro da noite cega
- sem dia e sem crepúsculo - cansas de esperar.
Porque se conheces o caminho que leva
em dois ou três minutos para a vida nova,
velho cego, o que esperas, que podes esperar?
E se pela amargura mais dura e destino,
animal velho e cego em caminho e tino,
eu que tenho dois olhos saberei te ensinar.
VIEJO CIEGO, LLORABAS
Viejo ciego, llorabas cuando tu vida era
buena, cuando tenías en tus ojos el sol:
pero si ya el silencio llegó, ¿qué es lo que esperas,
qué es lo que esperas, ciego, qué esperas del dolor?
En tu rincón semejas un niño que naciera
sin pies para la tierra, sin ojos para el mar,
y como las bestias entre la noche ciega
sin día y sin crepúsculo- se cansan de esperar.
Porque si tú conoces el camino que lleva
en dos o tres minutos hacia la vida nueva,
viejo ciego ¿qué esperas, qué puedes esperar?
Y si por la amargura más bruta del destino,
animal viejo y ciego, no sabes el camino,
ya que tengo dos ojos te lo puedo enseñar.
- Pablo Neruda, em "Crepusculário". [tradução José Eduardo Degrazia].
Entre sua vasta produção se destacam Crepusculário (1923), Veinte Poemas de Amor y una Canción Desesperada (1924), Tentativa del Hombre Infinito (1926), El habitante y su Esperanza (1926), Residencia en la Tierra (1925-1931), España en el Corazón, Himno a las Glorias del Pueblo en la Guerra (1936- 1937), La Espada Encendida, Buenos Aires (1970) e Discurso de Estocolmo (1972).
Fontes:
history.uol.com.br
elfikurten.com.br
google.com
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